Linha quatro




















No largo da Mutamba às seis e meia
carros pra cima carros pra baixo
gente subindo gente descendo
esperarei.

De olhar perdido naquela esquina
onde ao cair da noite a manhã nasce
quando tu surges
esperarei.

Irei pr'á bicha da linha quatro
Atrás de ti. (Nem o teu nome!)
Atrás de ti sem te falar
só a querer-te.

(Gente operária na nossa frente
rosto cansado. Gente operária
braços caídos sonhos nos olhos.

Na linha quatro eles se encontram
Zito e Domingas. Todos os dias
na linha quatro eles se encontram.

No maximbombo da linha quatro
se sentam juntos. As mãos nas mãos
transmitem sonhos que se não dizem.)

No maximbombo da linha quatro
conto meus sonhos sem te falar.
Guardo palavras teço silêncios
que mais nos unem.

Guardo fracassos que não conheces
Zito também. Olhos de cinza
como Domingas
o que me ofereces!

No maximbombo da linha quatro
sigo a teu lado. Também na vida.
Também na vida subo a calçada
Também na vida!

Não levo sonhos: A vida é esta!
Não levo sonhos. Tu a meu lado
sigo contigo: Pra quê falar-te?
Pra quê sonhar?

No maximbombo da linha quatro
não vamos sós. Tu e Domingas.
Gente que sofre gente que vive
não vamos sós.

Não vamos sós. Nem eu nem Zito.
Também na vida. Gente que vive
Sonhos calados sonhos contidos
Não vamos sós.

Também na vida! Também na vida!



Mário António
In “Obra poética”