Descrição de si mesmo junto a um copo de whisky no aeroporto, digamos em Minneapolis
sexta-feira, abril 07, 2006
Meus ouvidos ouvem cada vez menos das conversas, meus olhos vão ficando mais fracos, mas não se fartaram.
Vejo suas pernas em minissaias, em calças compridas ou tecidos voláteis,
Observo uma a uma, suas bundas e coxas, pensativo, acalentado por sonhos porno.
Velho depravado, é a cova que te espera, não os jogos e folguedos da juventude.
Não é verdade, faço apenas o que sempre fiz, compondo cenas dessa terra sob as ordens de uma imaginação erótica.
Não desejo a estas criaturas, desejo tudo, e elas são como o signo de uma convivência extática.
Não é minha culpa se somos feitos assim, metade contemplação desinteressada, e metade apetite.
Se após a morte eu chegar ao Céu, lá deve ser como aqui, só que me terei desfeito da obtusidade dos sentidos e do peso dos ossos.
Tornado puro olhar, sorverei ainda as proporções do corpo humano, a cor da íris, uma rua de Paris em junho de manhãzinha, toda a incompreensível, a incompreensível multidão das coisas visíveis.
Czeslaw Milosz