Lisboa perto e longe














Foto (espectacular) de Agostinho Dias



Lisboa chora dentro de Lisboa
Lisboa tem palácios sentinelas.
E fecham-se janelas quando voa
nas praças de Lisboa - branca e rota
a blusa de seu povo - essa gaivota.

Lisboa tem casernas catedrais
museus cadeias donos muito velhos
palavras de joelhos tribunais.
Parada sobre o cais olhando as águas
Lisboa é triste assim cheia de mágoas.

Lisboa tem o sol crucificado
nas armas que em Lisboa estão voltadas
contra as mãos desarmadas - povo armado
de vento revoltado violas astros
- meu povo que ninguém verá de rastos.

Lisboa tem o Tejo tem veleiros
e dentro das prisões tem velas rios
dentro das mãos navios prisioneiros
ai olhos marinheiros - mar aberto
- com Lisboa tão longe em Lisboa tão perto.

Lisba é uma palavra dolorosa
Lisboa são seis letras proibidas
seis gaivotas feridas rosa a rosa
Lisboa a desditosa desfolhada
palavra por palavra espada a espada.

Lisboa tem um cravo em cada mão
tem camisas que abril desabotoa
mas em maio Lisboa é uma canção
onde há versos que são cravos vermelhos
Lisboa que ninguem verá de joelhos.

Lisboa a desditosa a violada
a exilada dentro de Lisboa.
E há um braço que voa há uma espada.
E há uma madrugada azul e triste
Lisboa que não morre e que resiste.



Manuel Alegre

saudades de um ex-amor















construo sólidos castelos d’areia
que se destroem
no contacto
com a ímpia suavidade da onda.

… aspiração frustrada.

amor na concha de vento
no êxtase poético
na ondulante curva
da nossa união. na areia.

… amor na interrogação da onda.

minha lágrima:
néctar salgado
pérola de esperança
no mar adocicado.

… para quando o reencontro?



Conceição Cristóvão

Há Momentos



















Há momentos na vida de um Homem
Em que sabe que acordou diferente
E que já não é o mesmo para ele,
Mesmo que o seja para toda a gente...

Há momentos na vida de um Homem
Onde só pode entrar uma Mulher
Aquela que lhe trouxer
A flor do sexo
Desenhada a vermelho no ventre
E nada lhe perguntar...

Há momentos na vida de um Homem
Onde só pode entrar uma mulher
Aquela que lhe trouxer,
Num abraço total,
A ilusão da vida inteira...
E, depois, partir
Com a esperança de vida que ele semeou...

Há momentos na vida de um Homem
Onde só pode entrar uma Mulher
Para todo o Mundo se resumir
À flor vermelha
Como um bocado de sol
Que desponta numa telha!


António Cardoso

Medo e cruz



















De medo e diabo trazes o corpo envenenado enquanto a
mente balbucia incoerências
Por trás do véu de instintos espicaças a carne
O desejo sob uma resma de salmos
Em nome de que virtude contra quem levantarás a cruz
Um púlpito
A carne
Uma cruz
Ao mistério da criação a humanidade


Amélia Dalomba

Oh, mamy blue





Início dos anos 70.
Todos os dias António Sala colocava esta música no ar.
Cerca das 07:30.
Não saía de casa, nos Olivais, a pé, para percorrer o caminho até á Afonso Domingues sem a ouvir.

Imaginem aqueles dias de Janeiro, solarengos e extremamente frios...
Capa com os livros, como hoje se não usa, debaixo do braço... e o trautear da música.

Talvez venha desta música e deste tempo o gosto por músicas que "enchem o peito", que puxam pelo lado positivo, que empolgam.

Oh, mamy blue!

Hoje recordo-a e tento ganhar novo alento para enfrentar duríssimas batalhas que se perfilaram há muitos, muitos anos no horizonte.

Tal como São Jorge, também hei-de vencer o dragão.
Não precisarei da sua lança, apenas da sua inteligência, da sua coragem e da sua perseverança... e de um "hino" como... Mamy blue