Sobressalto

























Amor,
as luas mortas
caíram no segredo deste amor;
fujamos pela praia
embarquemos no vento!

As luas mortas
são mundos apodrecidos ...

O nosso amor balbucia
cantigas da era nova
e nas mãos
temos o húmus adubado e quente
para o jardim redolente
para a seara de pão
para a seara de amor...

Nada nos serve fugir
pior que fantasmas
são os miasmas
dos mundos apodrecidos...

Amor,
nos vales ermos, esquecidos
de toda a flor,
de todo o riso,
do amor ao amor,
das madrugadas e dos pássaros,
(fechadas todas as portas
ao susto e à escuridão,
com um beijo verde de esperança
cantando no coração)

Amor,
enterremos as luas mortas...



Lília da Fonseca

Tema de Natal





Salvem os Ricos




Olavo Bilac
Chegou a crise, não há razão para temer.

David Fonseca
É que nesta crise, o Teixeira dos Santos vai-nos proteger.

Ana Bacalhau
Mas neste mundo injusto, o dinheiro está garantido.

Angélico
Como o bodo para o pobre, o remediado, e o sem abrigo.

Bob Dylan
Mas pensa naqueles, os multimilionários.

George Michael
Baby. Ficaram sem Bancos, e sem juro dos salários.

Sérgio Godinho
E sem direito a indemnizações, tem que pedir o aval,
à sopa dos pobres dos ricos: o Banco de Portugal.

Rui Reininho/Ana Bacalhau
O desespero tomou conta de toda a Quinta da Marinha.

Rui Reininho
Em vez de lavagante, comem lambuginha.

Bill Kaulitz
E vão ter de abandonar o Conselho de Estado.
O quadro do Miró foi penhorado.

Adriana Calcanhoto
Porque esse Portugal já não é neoliberal.

Zé Pedro/Bill Kaulitz/George Michael
Saberão que estamos no Natal.

Axl Rose
Oiçam bem.

António Calvário
Eufemismo dos milhões.

Axl Rose
Opulência.

António Calvário
Tratou-os como aldrabões.

Axl Rose/António Calvário
Saberão que estamos no Natal.


Refrão

Salvem os ricos.Salvem os ricos.
Salvem os ricos, ajudem os milionários.
[repete]



Contemporâneos

A fome que te tenho

























Foto de Tuta, aqui




A fome que te tenho, descontrolada,
de te ter, o de te possuir,
o meu corpo, fogo... ardendo, queimando,
torna-se num imenso doloroso, num profundo,
os meus olhos vagueiam, olho-te,
o meu pensamento voa,
os lábios incham, a face dói,
a língua esculpida na tua, toca-te, engole-te,
o meu corpo procura-te para o arrepiar,
do sangue fervendo,
esta fome insaciável,
o leve,
o leve deste papel onde agora te sinto
sem o peso que é isso.

Sangue meu, meu sangue, ferve, ebule,
o meu corpo arrepiado, o meu ventre contorna-se,
o suor corre suavemente,
a minha boca seca,
as palavras, essas, perdem-se pelo espaço,
esse torna-se tão pequeno,
não consigo respirar,
o corpo esta pregado,
não sei saber qual o passo a seguir,
não posso mais,
o pensamento pasmo e susto,
o desejo grande, profundo,
a vontade de chorar, a vontade de fugir,
de não repartir o mesmo espaço,
essa química de todos os sentidos,
fundidas em desespero completo,
perdi-me...




Sónia Sultuane

O pássaro



















Quando ele apanhou o pássaro
cortou-lhe as asas.
O pássaro voou mais alto.

Quando voltou a apanhar o pássaro
cortou-lhe as patas.
O pássaro deslizou como uma barca.

Furioso, cortou-lhe o bico.
O pássaro cantou com o seu coração,
como canta uma harpa.

Então cortou-lhe o pescoço.
E de cada gota de sangue
Saiu um pássaro mais brilhante.

Nada continua a ser mais caro,
ao Poeta, que a liberdade.




Maurice Carême
Tradução de António Ramos Rosa

Alma negra




















Diz-se que o homem negro não tem alma,
ou antes que tem alma tão bisonha,
tão grosseira, tão vil... – Há quem suponha
que o negro só se exalta, e não se acalma:

que só conhece o vício, e não a palma,
a crença bruta, e não a fé risonha;
em suma, que não ama, que não sonha,
com paz divina, com divina calma.

Há quem apenas veja, meramente,
que a África é o sol do meio-dia,
– terra queimada pelo sol ardente.

Há quem não saiba ver ou avaliar
toda a celeste e lírica poesia
duma noite africana de luar...




Geraldo Bessa Victor

Beijo sem Nome






















Quando te disse que era da terra selvagem do vento azul e das praias morenas...
Do arco-íris das mil cores, do sol com fruta madura e das madrugadas serenas...
Das cubatas e musseques, das palmeiras com dendém,
das picadas com poeira, da mandioca e fuba também...
Das mangas e fruta pinha, do vermelho do café,
dos maboques e tamarindos, dos cocos, do ai u'é...
Das praças no chão estendidas com missangas de mil cores,
os panos do Congo e os kimonos, os aromas, os odores...
Dos chinelos no chão quente, do andar descontraído,
da cerveja ao fim da tarde, com o sol adormecido...
Dos merengues e do batuque, dos muxiques e dos mupungos,
dos embondeiros e das gajajas, da macanha e dos maiungos...
Da cana doce e do mamão, da papaia e do cajú...

Tu sorriste e sussurraste...
- Sou da mesma terra que tu!




Ana Paula Lavado


Trancrito, com a devida vénia, do magnífico "Shelling Memories"

O Amor e o Futuro

























Foto de "Angola em fotos"





Calar
esta linguagem velha que não entendes
(Tu és naturalmente de amanhã
como a árvore florida)
e falar-te na linguagem nova do futuro
engrinaldada de flores.

Calar
esta saudade velha
e a nostalgia herdada de brancos marinheiros
e de escravos negros
de noite sonhando lua
nos porões dos negreiros.

Calar
todo este choro antigo
hoje disfarçado em slow, bolero e blue
(Teu sentimento
e esta pressão dorida que não mente:
teus seios contra o meu peito
a tua mão na minha
o calor das tuas coxas
e os teus olhos ardentes...)

Calar tudo isso
(Tu és naturalmente do futuro
como a árvore florida)
e ensaiar o canto novo
da esperança a realizar.
Cantar-te
árvore florida
espera de fruto
antemanhã

Nascer do Sol em minha vida.



Mário António

Decálogo de Lenine























1 - Corrompa a juventude e dê-lhe liberdade sexual;
2 - Infiltre e depois controle todos os veículos de comunicação de massa;
3 - Divida a população em grupos antagônicos, incitando-os a discussões sobre assuntos sociais;
4 - Destrua a confiança do povo em seus líderes;
5 - Fale sempre sobre Democracia e em Estado de Direito, mas, tão logo haja oportunidade, assuma o Poder sem nenhum escrúpulo;
6 - Colabore para o esbanjamento do dinheiro público; coloque em descrédito a imagem do País, especialmente no exterior e provoque o pânico e o desassossego na população por meio da inflação;
7 - Promova greves, mesmo ilegais, nas indústrias vitais do País;
8 - Promova distúrbios e contribua para que as autoridades constituídas não as coíbam;
9 - Contribua para a derrocada dos valores morais, da honestidade e da crença nas promessas dos governantes. Nossos parlamentares infiltrados nos partidos democráticos devem acusar os não-comunistas, obrigando-os, sem pena de expô-los ao ridículo, a votar somente no que for de interesse da causa socialista;
10 - Procure catalogar todos aqueles que possuam armas de fogo, para que elas sejam confiscadas no momento oportuno, tornando impossível qualquer resistência à causa...



Vladímir Ilich Uliánov (1913)



Apliquem-se estes princípios a qualquer sector em particular (ao da limpeza em Lisboa, p.e.).
Recue-se uns anos ao consulado de Rui Godinho.
Pense-se no que então não foi feito (e podia ter sido)... no que desde então não pôde ser feito (porque não interessava fazer).. e no que não devia ter sido feito (e foi...)
Pense-se no desinvestimento e na penúria por que o sector passou desde então...
Pense-se que a "invenção" da ABC (Associação Baixa Chiado) é do tempo do edil do PCP á frente da limpeza.
Calcule-se que já datam dessa altura os primeiros passos no sentido de privatização.
Some-se a isto a luta desigual (e desleal) que os muitos e bons funcionários que a CML possui travam contra o labéu de que tudo o que é privado é melhor (não sendo esclarecido se é mais barato ou não, se os serviços apresentam melhor prontidão ou qual o grau de eficiência).
Acrescente-se ser este um trabalho duro e mal pago.
Tome-se em conta que as reformas antecipadas e a melhor remuneração no sector privado tem vindo a esvaziar o sector de profissionais.
Sabendo-se que a sua não substituição, além de imperativo legal, serve os propósitos de todos quantos pretendem entregar de bandeja o sector a privados... E quanto pior estiver mais fácil e mais barato (politicamente) se torna.

Julgo ser compreensível o descontentamento do pessoal de limpeza da capital pelo abandono de que tem sido vítimas. Muito, mas muito pior, que o simples facto de ganharem mal...

É óbvio para todos que o processo que está em marcha não terá retrocesso e que dentro de muito poucos anos serviços básicos de uma cidade serão entregues á gula de quem tem como único objectivo o lucro.. e não o serviço público.

Por muito menos que um pataco ver-se-ão, como MF Leite diz com alguma dose de xenofobia, grandes contributos para o combate ao desemprego nalguns países, "toneladas" de trabalhadores mais mal pagos que os actuais mas que darão uma ideia de eficácia e omnipresença que serão sempre fantasiosos... para quem sabe e tranquilizadores para... quem não conhece.

A decisão é legítima por parte da CML mas não há qualquer necessidade de se escudar em pretensas experiências... Não é isso que pretendem, não é isso que vai acontecer... e todos o sabem!

Fica apenas como lição o aproveitamento deste "Decálogo de Lenine" para todos os fins, por todos os quadrantes...
Há muito que o pragmatismo (eufemismo de muita coisa...) tomou conta do espectro político-partidário. Não interessa muito o que possa acontecer desde que todos tenham o seu proveito.

O PS conseguirá libertar-se de um sector muito visto e presente junto da população e que foi propositadamente ao longo dos anos desprotegido e coberto de dificuldades e calúnias.
O PCP - que nada fez antes a não ser ajudar o processo! - conseguirá, por muito tempo (mas sobretudo agora...) capitalizar o descontentamento de um sector infiltrado por si e votado ao abandono.
Dos outros não reza a história... Cavalgarão a onda sempre que lhes aprouver, sempre que o benefício seja maior que o custo.

Nuno Krus Abecasis, que fez deste sector um dos mais dinâmicos e organizados da CML e por quem mais carinho tinha, diga-se também, deverá ter dado já muitas cambalhotas no seu túmulo.

Para se perceber a hipocrisia reinante deixo aqui alguns tópicos respigados em alguns sítios que falam do assunto:

Em O Jumento


Caro Jumento

eu concordo f àcilmente, que uma greve convocada sem objectivos claros de reivindacão laboral é uma vergonha.E tamb ém concordo que o PCP anda deslumbrado com o apoio que as últimas greves têm tido por parte das respectivas classes.Mas isso é uma coisa( que se deve denunciar), outra coisa é tentar saber o que se passa realmente. Além disso, eu que comecei a visitar este blog há relativamente pouco tempo, noto uma certa agressividade e também leviandade nos seus comentários ao PCP.
José Leitão 12.10.08 - 6:18 pm


Caro Jumento

Isto como em tudo na vida o PCP/STAL tem dois pesos e duas medidas san ão vejamos há diferenças onde o PCP é poder e onde o PCP é oposição , onde o PCP está no poder o STAL dá cobertura como na C.M.PALMELA em que esta já privatizou alguns circuitos e não vimos o STAL fazer nada em prol dos trabalhdores e quando confrontado com esta situação os dirigentes do STAL refugiam-se de que esta é uma situação pontual mas já lá vão 3 anos o mesmo acontece com a manutenção dos jardins que já estão privatizados em cerca de 90% assim como outros serviços´, aqui em PALMELA funciona a logica partidaria é a vida dois pesos e duas medidas
foliveiracontente 12.09.08 - 11:44 pm


Em Der Terrorist



Em resumo... por ser necessário aos propósitos a atingir... A luta continua!


Por ser representativo da forma de actuação... deixo-vos com uma foto de alguns "monges budistas" no Tibete após retomarem o seu "hábito" normal de soldados.


Como se não o soubessemos!







O que importa se te vais



















O que importa se te vais,
se ficaras sempre dentro de mim,
o que importa se este oceano que é a vida seja longo,
se mais longo consegue ser o meu amor por ti,
o que importa se esse oceano um dia te tenha roubado,
se um dia uma gota em mim tenha deixado,
a minha sede tenha matado,
bebi algo puro e belo,
que importa se esse oceano me haja abandonado,
e a minha gota houvesse levado,
mas se esse gosto em mim tenha ficado cravado.




Sónia Sultuane

Posse




















Foto de aoluar, aqui




Deitei-me sobre o teu cansaço,
na esperança de trazer-te o descanso
que há tanto tempo em vão procuras.

Cobri teu corpo
e tive-te, e perdi-te ao alvorecer,
quando tudo se confunde
e a noite é dia, e o dia é noite,
e as estrelas são o instrumento
dos nossos sonhos e dos nossos êxtases.

Encontrei-te depois,
quando te perdeste e me encontraste também,
e já o dia amanhecia outra vez…



Anny Pereira

Minha Angola




Sam Mangwana

Declaração




















As aves, como voam livremente
num voar de desafio!
Eu te escrevo, meu amor,
num escrever de libertação.

Tantas, tantas coisas comigo
adentro do coração
que só escrevendo as liberto
destas grades sem limitação.
Que não se frustre o sentimento
de o guardar em segredo
como liones, correm as águas do rio!
corram límpidos amores sem medo.

Ei-lo que to apresento
puro e simples – o amor
que vive e cresce ao momento
em que fecunda cada flor.

O meu escrever-te é
realização de cada instante
germine a semente, e rompa o fruto
da Mãe-Terra fertilizante.



Agostinho Neto

o paraíso nós o perdemos em busca do corpo























Foto de "Angola em fotos"





Dos teus medos desliza a serpente nativa
esta se ausenta dos nossos murmúrios
e o seu rasto cega-nos.

Nesse pasto cheguei depois de ti
e já o mundo perdido, amava.
Canções do corpo suspiravam
de atentos tambores urdidos no esquecimento.

Os frutos insaciáveis repartidos em nós
e o hino húmido de palavras que nos excitam
são palavras desafortunadas,
comemo-las e fenecemos.

O paraíso era apenas uma ideia
que ainda nos deixa de bocas aguadas.
Por agora busque-me, contigo moverei
a serpente nativa.



João Tala

Dez grãozinho di terra





















Es dez grãozinho di terra
Qui Deus espadjá na mei di mar
És é di nós és cá tomado na guerra
É Cabo Verde terra querida

Oh Cabo Verde terra 'stimada
Terra di paz terra di gozo
Tude quem djobel na sê regoge
El ca ta bai, el crè ficá
E s'el mandado el ta tchorá

Tchorá sodadi di bôs morenas
Quês ta levá na pensamento
Tchorá recordaçons eternas
Di tempo qui ca tinha sofrimento

Ma mi'm tem fé na Noss Senhor
M'ês vida c'a bai sempre assim
M'el ta libiano di tudo nôs dor
Pês sofrimento podê tem fim



Jotamont

Obama e um acto de cultura universal





















Por Manuel Rui, gentilmente enviado pelo amigo Aires Bustorff





Eu sempre me confundi na realidade com a utopia. Ou na insatisfação constante como forma quase de fingir felicidade na busca, na procura e imitação de coisas muito simples como o voar dos pássaros, o declinar do sol, o brilho das estrelas e o mistério das conchas que aconteciam com os meus pés à beira mar na areia. Sempre não me conseguindo encontrar com o paraíso do infinitamente bom e infinitamente belo para todos, quase desinfinitando a morte que é o único lugar infinito mas parte da vida, o infinitamente belo que até poderia ser um contraste com o infinitamente bom que sempre para mim ficaram sem ser, iguais à inexistência ou à infelicidade de não procurar mais nada, muito antes da nostalgia ou depois da saudade da morte.

Afinal viver é também não imaginar aquilo que pode acontecer enquanto estamos vivos. Só que eu nunca pensei que em vida, para além de tanta coisa que estava, ainda que muito longe, mas no horizonte por detrás da noite e da nuvem, pudesse ainda ter vivido sonhos, porque a minha geração viveu sonhos depois de os ter sonhado no passa-palavra de muitos silêncios. E também viveu a morte de muita alegria triste.

Mas agora era demais. Numa data e hora em que um grande amigo meu fazia anos. Quatro de Novembro. Eu a telefonar-lhe e ele quase ou mesmo esquecido do seu aniversário por causa de OBAMA.

Era algo que nos tocava e falámos ao telefone. Porque era uma coisa que estava impensada no nosso tempo. A utopia tinha ultrapassado a nossa imaginação. Já não era tanto uma eleição ou uma vitória. Fazia semanas que vivíamos a novidade. Principalmente porque OBAMA falara mais ou menos que se mudarmos a sala podemos mudar a casa; e se mudarmos a casa podemos mudar a rua; e se mudarmos a rua podemos mudar a cidade; e se mudarmos a cidade podemos mudar o estado; e se mudarmos o estado podemos mudar o país; e se mudarmos o país podemos mudar o mundo.

OBAMA, em gesto de sagrado, no discurso de Filadélfia, tirou o pé do tiro do reverendo Jeremiah Wright. Embora o reverendo tivesse razão mas era uma razão da memória e da injustiça. Uma razão sobre os que haviam sido negados como pessoas, deixando suor e sangue nas plantações de tabaco e açúcar. Uma razão que podia ser entendida como rancor.

Nesse discurso, OBAMA trouxe uma utopia ligando a jovem Ashley e um mais velho que estava ali por Ashley estar.

No dia e hora em que escrevo este texto ainda não sei se OBAMA ganhou. Mas não é tanto por isso que estou a escrever. É mais por causa do outro que nunca percebeu que eu existo e ele só pode ser também se deixar de estar assim para podermos ser todos.

OBAMA tem um significado do maior acto de cultura universal do início deste século. No século passado, quem tinha televisão ficou uma noite inteira à espera que um homem pisasse a lua.

Neste princípio de século, OBAMA conseguiu criar uma energia, um astral de muitas mãos inteiras pelo pensamento de pessoas de todas as partes do mundo, numa corrente parecida com uma constelação de paz sem fronteriras. E Isso é um acto de cultura que vai ficar.

Não importa que este Messias traga milagres. Importa é o milagre cultural de pôr uma boa parte do mundo inteiro a olhar para ele como um salvador e perder uma noite só a olhar para um televisor como se OBAMA fosse uma madrugada.

No século passado, foram à lua. Agora OBAMA parece que desceu da lua e chegou à terra.

No século passado foi Mandela.

Mas antes de Mandela, o reverendo Luter King já tinha orado que tinha um sonho. O reverendo foi assassinado por causa do sonho.

Mandela tornou realidade um bocado do sonho do reverendo. Por cima de tanta memória que sobrou para os blues.

OBAMA acrescenta mais um bocado de realidade ao sonho do reverendo.

Como Agostinho Neto deixou escrito:

E DO DRAMA INTENSO
DUMA VIDA IMENSA E ÚTIL
RESULTOU CERTEZA

AS MINHAS MÃOS COLOCARAM PEDRAS
NOS ALICERCES DO MUNDO
MEREÇO O MEU PEDAÇO DE PÃO.







Manuel Rui

Alma Negra



















Foto de Denis Farrell, aqui






Diz-se que o homem negro não tem alma,
ou antes que tem alma tão bisonha,
tão grosseira, tão vil... – Há quem suponha
que o negro só se exalta, e não se acalma:

que só conhece o vício, e não a palma,
a crença bruta, e não a fé risonha;
em suma, que não ama, que não sonha,
com paz divina, com divina calma.

Há quem apenas veja, meramente,
que a África é o sol do meio-dia,
– terra queimada pelo sol ardente.

Há quem não saiba ver ou avaliar
toda a celeste e lírica poesia
duma noite africana de luar...



Geraldo Bessa Victor

Admiração é...
























Capa do jornal "Record" de hoje





Brasil, 6 - Portugal, 2
A imprensa portuguesa fala, quase em uníssono, em humilhação...

Humilhação???

Humilhação é ter uma equipa claramente superior, superiormente orientada e com jogadores de superior categoria e, nessas condições, perder clamorosamente 6-2!!!

Foi isso que aconteceu??? Não, com toda a clareza!
Não houve qualquer humilhação.

O Brasil é claramente superior... O Brasil foi claramente superior em todos os capítulos de jogo!
Onde está a admiração??

Admiração é... termos conseguido ganhar em Malta!
Admiração é... caber na cabeça de alguém que uma equipa em claro declínio tenha colocado como hipótese, ainda que meramente académica, estar ao mesmo nível do Brasil!!
Admiração é... alguém acreditar em Queirós quando afirma que a equipa se deslumbrou com um golo aos 4 minutos. Completamente estapafúrdia esta ideia!!
Admiração é... que alguém penssasse que, pelo facto de Scolari ter tido 1 empate e 2 vitórias contra o Brasil, ganhar era um dado adquirido e o Brasil tinha passado ad aeternum á condição de nosso "cliente"... Santa ingenuidade!
Admiração é... que alguém tenha pensado que o jogo serviria apenas para que Káka passasse sem luta a "coroa" a Cristiano Ronaldo e o Brasil se vergasse á superioridade que, para Portugal, isso representaria. Claríssimo engano!!! Se o jogo se resumisse a isso, Ronaldo teria perdido talvez não 6-2 com Káka mas aí uns... 10-0!!!!
Admiração é... ninguém perceber que para Ronaldo brilhar precisa de ter uma equipa com ele. No United é 10+Ronaldo, aqui pretende-se que seja Ronaldo+10!!! Idiotice!
Admiração é... que apenas agora se tenha percebido não ser possível haver um treinador campeão do mundo sem perceber nada do que faz.
Admiração é... que o patrão de Queirós tenha voltado a permitir jogos de bastidores, de influência dos clubes,tenha voltado a optar pelo poder dos empresários ou pelo poder que os media tem em fazer e desfazer equipas...
Admiração é... ninguém entender que faz falta no balneário para defesa dos jogadores, para implementação de um modelo, de modo a conseguirem-se atingir os objectivos, de alguém que mande efectivamente. Mesmo que seja desagradável, casmurro e apelidado de sargentão. Ao que sei a diplomacia tem lugar no Palácio das Necessidades e não em qualquer campo de futebol.

O que custou ver no Brasil/Portugal foi o "baile" - o mesmíssimo tipo de "baile" que o FC Porto dançou no Emirate Stadium.
Num e noutro foi confragedor e chegou a dar pena... e aí estou de acordo com Queirós.
Deu pena!
Não pode é, com todo o peso que isso tem, deixar de assumir as r-e-s-p-o-n-s-a-b-i-l-i-d-a-d-e-s.
Não sou eu que ganho palettes de dinheiro para treinar e orientar a equipa. É ele!

Em qualquer clube, Queirós não chegaria ao Natal.
Aqui vai chegar.
Os media dar-lhe-ão o apoio... porque precisam dele. No dia em que ele, farto de palpites, lhes virar as costas... será crucificado por menos que estes 6-2 e, provavelmente, por qualquer fait-divers sem qualquer importância.

Por este andar voltaremos a estar na fase final do Mundial Ibérico (2018) provavelmente sob a batuta de um velho astuto e vivido de nome... Luiz Felipe Scolari.

Último poema

























Sair do temporal
é ganhar tempo pra coser as velas
é ganhar tempo pra fazer aguada
e aparelhar.
O meu destino certo e tão inquieto
é o destino trémulo e concreto
duma agulha de marear.

Ah, não esperem que eu não espere,
nem acreditem que eu tema
ou que eu possa naufragar…
Numa vela renovada
há insistência pra conter o vento,
há arrogância pra conter o mundo,
há energia pra domar o tempo
e força pra singrar.

Sair do temporal
é ter a nostalgia do combate
que vai recomeçar.

Tomei o gosto às horas de calema
e sou irmão do mar.




Cochat Osório

Meditemos...
























Um velho índio descreveu certa vez os seus conflitos internos.

"Dentro de mim existem dois cachorros, um deles é cruel e mau, o outro é muito bom e dócil. Eles estão sempre a brigar".

Quando lhe perguntaram qual dos cachorros ganharia a briga, o sábio índio parou, reflectiu e respondeu:

"Aquele que eu alimentar"

A Casa

























A pedra, o pau, o barro,
Os alicerces
Da casa prometida
Sabida
Como certa.

A pedra dura
Madeira que se dobra
O barro que se molda
Coragem que perfura
A timidez que sobra
Paciência que se amolda.

Um bocado de sonho em cada mão,
Um resto de azul
No resto da manhã,
E amanhã,
De manhã cedo,
Sem medo,
A casa que te ofereço
Cercada de amizade.


Aires de Almeida Santos

Jerónimo Sousa que se cuide!...
























«Eu não acredito em reformas quando se está em democracia, quando não se está em democracia, é outra conversa, eu digo como é que é e faz-se; e até não sei, se a certa altura, não é bom haver seis meses sem democracia, mete-se tudo na ordem e depois então, venha a democracia»



Manuela Ferreira Leite
Lisboa, 18/11/2008




Séria candidata a Secretária-Geral do PCP.

Será que os "setôres" conseguem, por isto, juntar 140.000 para protestar contra esta barbaridade?



"Este país é um colosso! Está tudo grosso!"
(Ivone Silva e Camilo de Oliveira)


Posse























Foto de Quark, aqui




Deitei-me sobre o teu cansaço,
na esperança de trazer-te o descanso
que há tanto tempo em vão procuras.

Cobri teu corpo
e tive-te, e perdi-te ao alvorecer,
quando tudo se confunde
e a noite é dia, e o dia é noite,
e as estrelas são o instrumento
dos nossos sonhos e dos nossos êxtases.

Encontrei-te depois,
quando te perdeste e me encontraste também,
e já o dia amanhecia outra vez…



Anny Pereira

Até que enfim!!!





















Até que enfim!...

Há muito que se tornava visível a qualquer cego que as “claques” dos clubes de futebol nada mais são que um alfobre de vândalos, universidade de fanatismo e de intolerância.
Tudo o que é excessivo é doentio!
Tudo o que é excessivo acabará por conduzir a situações irracionais.

Espero que, a exemplo do que sucedeu aos “No Name Boys”, o mesmo suceda noutras latitudes e longitudes.
Atitudes e bibliografia publicada são já, se se quiser, motivo para actuação.

Todos têm que intuir que no desporto, seja amador ou profissional, não pode haver lugar para estes energúmenos.

Louvo, apesar disso, a coragem do Benfica (meu clube) em não ceder á chantagem, legalizando a violência.
Entre a declaração de renúncia á violência e o efectivo abandono vai alguma distância.

Que não falte a coragem para apurar tudo o que seja possível!
Que a investigação seja o mais extensa e abrangente possível!
Que não faltem forças quando se chegar a pessoas importantes…
Que não se arranjem questões processuais para limpar a porcaria toda…
Que ninguém venha, depois de ter cometido crimes, ganhar dinheiro por “prisões ilegais”!
Que haja profissionalismo na investigação.

Lago
























Foto de Luiz Aguiar, aqui






Quando tua libélula forma
esvoaça sobre meu corpo
um lago vítreo rebenta
em círculos argênteos.
As margens se fazem distantes
e flutuo vitória-régia
na superfície do desejo maduro.
A vida, surpresa aquática,
me arrasta em cheiros
nas ondas negras dos teus cabelos.
Enfim, sem as amarras da razão,
aprendo a nadar
nas profundezas do teu riso
como uma estrela-do-mar.



Jurema Barreto de Souza

Carrossel



















P/ Lídia de Paula



tantas
noites
entre
nós

muitas luas
movendo silêncios
e palavras nuas

em cada gesto
sempre um festa
com gosto de paixão

te quero
te espero
muito além
de toda ilusão



Zhô Bertholini

E se Obama fosse africano?






















Os africanos rejubilaram com a vitória de Obama. Eu fui um deles. Depois de uma noite em claro, na irrealidade da penumbra da madrugada, as lágrimas corriam-me quando ele pronunciou o discurso de vencedor. Nesse momento, eu era também um vencedor. A mesma felicidade me atravessara quando Nelson Mandela foi libertado e o novo estadista sul-africano consolidava um caminho de dignificação de África.

Na noite de 5 de Novembro, o novo presidente norte-americano não era apenas um homem que falava. Era a sufocada voz da esperança que se reerguia, liberta, dentro de nós. Meu coração tinha votado, mesmo sem permissão: habituado a pedir pouco, eu festejava uma vitória sem dimensões. Ao sair à rua, a minha cidade se havia deslocado para Chicago, negros e brancos respirando comungando de uma mesma surpresa feliz. Porque a vitória de Obama não foi a de uma raça sobre outra: sem a participação massiva dos americanos de todas as raças (incluindo a da maioria branca) os Estados Unidos da América não nos entregariam motivo para festejarmos.

Nos dias seguintes, fui colhendo as reacções eufóricas dos mais diversos recantos do nosso continente. Pessoas anónimas, cidadãos comuns querem testemunhar a sua felicidade. Ao mesmo tempo fui tomando nota, com algumas reservas, das mensagens solidárias de dirigentes africanos. Quase todos chamavam Obama de "nosso irmão". E pensei: estarão todos esses dirigentes sendo sinceros? Será Barack Obama familiar de tanta gente politicamente tão diversa? Tenho dúvidas. Na pressa de ver preconceitos somente nos outros, não somos capazes de ver os nossos próprios racismos e xenofobias. Na pressa de condenar o Ocidente, esquecemo-nos de aceitar as lições que nos chegam desse outro lado do mundo.

Foi então que me chegou às mãos um texto de um escritor camaronês, Patrice Nganang, intitulado: "E se Obama fosse camaronês?". As questões que o meu colega dos Camarões levantava sugeriram-me perguntas diversas, formuladas agora em redor da seguinte hipótese: e se Obama fosse africano e concorresse à presidência num país africano? São estas perguntas que gostaria de explorar neste texto.

E se Obama fosse africano e candidato a uma presidência africana?

1. Se Obama fosse africano, um seu concorrente (um qualquer George Bush das Áfricas) inventaria mudanças na Constituição para prolongar o seu mandato para além do previsto. E o nosso Obama teria que esperar mais uns anos para voltar a candidatar-se. A espera poderia ser longa, se tomarmos em conta a permanência de um mesmo presidente no poder em África. Uns 41 anos no Gabão, 39 na Líbia, 28 no Zimbabwe, 28 na Guiné Equatorial, 28 em Angola, 27 no Egipto, 26 nos Camarões. E por aí fora, perfazendo uma quinzena de presidentes que governam há mais de 20 anos consecutivos no continente. Mugabe terá 90 anos quando terminar o mandato para o qual se impôs acima do veredicto popular.

2. Se Obama fosse africano, o mais provável era que, sendo um candidato do partido da oposição, não teria espaço para fazer campanha. Far-Ihe-iam como, por exemplo, no Zimbabwe ou nos Camarões: seria agredido fisicamente, seria preso consecutivamente, ser-Ihe-ia retirado o passaporte. Os Bushs de África não toleram opositores, não toleram a democracia.

3. Se Obama fosse africano, não seria sequer elegível em grande parte dos países porque as elites no poder inventaram leis restritivas que fecham as portas da presidência a filhos de estrangeiros e a descendentes de imigrantes. O nacionalista zambiano Kenneth Kaunda está sendo questionado, no seu próprio país, como filho de malawianos. Convenientemente "descobriram" que o homem que conduziu a Zâmbia à independência e governou por mais de 25 anos era, afinal, filho de malawianos e durante todo esse tempo tinha governado 'ilegalmente". Preso por alegadas intenções golpistas, o nosso Kenneth Kaunda (que dá nome a uma das mais nobres avenidas de Maputo) será interdito de fazer política e assim, o regime vigente, se verá livre de um opositor.

4. Sejamos claros: Obama é negro nos Estados Unidos. Em África ele é mulato. Se Obama fosse africano, veria a sua raça atirada contra o seu próprio rosto. Não que a cor da pele fosse importante para os povos que esperam ver nos seus líderes competência e trabalho sério. Mas as elites predadoras fariam campanha contra alguém que designariam por um "não autêntico africano". O mesmo irmão negro que hoje é saudado como novo Presidente americano seria vilipendiado em casa como sendo representante dos "outros", dos de outra raça, de outra bandeira (ou de nenhuma bandeira?).

5. Se fosse africano, o nosso "irmão" teria que dar muita explicação aos moralistas de serviço quando pensasse em incluir no discurso de agradecimento o apoio que recebeu dos homossexuais. Pecado mortal para os advogados da chamada "pureza africana". Para estes moralistas – tantas vezes no poder, tantas vezes com poder - a homossexualidade é um inaceitável vício mortal que é exterior a África e aos africanos.

6. Se ganhasse as eleições, Obama teria provavelmente que sentar-se à mesa de negociações e partilhar o poder com o derrotado, num processo negocial degradante que mostra que, em certos países africanos, o perdedor pode negociar aquilo que parece sagrado - a vontade do povo expressa nos votos. Nesta altura, estaria Barack Obama sentado numa mesa com um qualquer Bush em infinitas rondas negociais com mediadores africanos que nos ensinam que nos devemos contentar com as migalhas dos processos eleitorais que não correm a favor dos ditadores.

Inconclusivas conclusões

Fique claro: existem excepções neste quadro generalista. Sabemos todos de que excepções estamos falando e nós mesmos moçambicanos, fomos capazes de construir uma dessas condições à parte.

Fique igualmente claro: todos estes entraves a um Obama africano não seriam impostos pelo povo, mas pelos donos do poder, por elites que fazem da governação fonte de enriquecimento sem escrúpulos.

A verdade é que Obama não é africano. A verdade é que os africanos - as pessoas simples e os trabalhadores anónimos - festejaram com toda a alma a vitória americana de Obama. Mas não creio que os ditadores e corruptos de África tenham o direito de se fazerem convidados para esta festa.

Porque a alegria que milhões de africanos experimentaram no dia 5 de Novembro nascia de eles investirem em Obama exactamente o oposto daquilo que conheciam da sua experiência com os seus próprios dirigentes. Por muito que nos custe admitir, apenas uma minoria de estados africanos conhecem ou conheceram dirigentes preocupados com o bem público.

No mesmo dia em que Obama confirmava a condição de vencedor, os noticiários internacionais abarrotavam de notícias terríveis sobre África. No mesmo dia da vitória da maioria norte-americana, África continuava sendo derrotada por guerras, má gestão, ambição desmesurada de políticos gananciosos. Depois de terem morto a democracia, esses políticos estão matando a própria política. Resta a guerra, em alguns casos. Outros, a desistência e o cinismo.

Só há um modo verdadeiro de celebrar Obama nos países africanos: é lutar para que mais bandeiras de esperança possam nascer aqui, no nosso continente. É lutar para que Obamas africanos possam também vencer. E nós, africanos de todas as etnias e raças, vencermos com esses Obamas e celebrarmos em nossa casa aquilo que agora festejamos em casa alheia.



Por Mia Couto


Gentilmente enviado por email pelo amigo Aires Bustoff. Obrigado.

De que raio estamos á espera???
























Não é habitual debruçar-me por estas bandas com assuntos de actualidade… mas torna-se irresistível.
A poluição é tanta.
A desinformação é de tal ordem.
A insensatez está a um nível inultrapassável.

Por acaso alguém será capaz de parar para pensar no futuro das gerações mais jovens e, inevitavelmente, no destino a dar ao país???
Parece-me que não!

O governo, ciente da sua “certeza”, não abdica de nada.
A oposição, porque só existe na condição de ser obstáculo e de criar dificuldades e embaraços – qualquer que ela seja ou tenha sido! - eleva cada vez mais os sound-bytes indispensáveis á criação de um clima emocional do qual possa tirar proveito.

Mas que alternativas a esta miserável situação??
Há que prosseguir cegamente???
Há que parar para pensar???

Que o clima eleitoral que se vive justifica a berraria toda – já o sabemos!
Que nestas circunstâncias a emoção prevalece sobre a razão – é evidente!
Que todo este impasse na Educação (e noutros sectores, também…) – que se vive desde há 34 anos! – é dramático para o país – até um imbecil o sabe.

Lamentável é que não se tenha parado para pensar… O tempo do PREC passou há muito e alguma tranquilidade foi devolvida entretanto.

Vou colocar tudo em causa!

O sistema educativo está obsoleto porque não corresponde ás necessidades do país e hipoteca o seu futuro.
É sabido que qualquer moldavo, escandinavo, esloveno que, honestamente, dê no nosso país o seu suor para a riqueza e o desenvolvimento do nosso país, e tenha conseguido trazer a sua família, fica perplexo com a desorganização, insegurança, falta de exigência e de trabalho nas escolas portuguesas.
Ninguém é capaz de negar isto!
Nem o Dr. Mário Nogueira…nem a Ministra da Educação, ou será que são???

Se o 25 de Abril era necessário para democratizar o acesso á educação e ao funcionamento das escolas a verdade é que obliterou por completo a exigência, negou a competitividade e caucionou o desenvolvimento da mediocridade.
Nem 34 anos chegaram ainda para se ver o inevitável.
E também não há o menor esboço de coragem política para pôr cobro a este estado de coisas.

Se antes prevalecia o elitismo, agora passamos a conviver com multidões de licenciados sem emprego, alunos que abandonam a escola e níveis assustadores de iliteracia.

Ao poder discricionário, e muitas vezes violento, dos professores sucedeu a anarquia governada pelas RGA’s e a esta sucedeu uma mixórdia que pretende estabelecer o equilíbrio (?!?!?) entre professores, pais e alunos.
Ao terror exercido pelos professores sucedeu o enxovalho e as ameaças a estes.

A situação é tão grave que os pais foram transformados numa espécie de “Comissão de Melhoramentos” da escola que tem, inclusive, como fim angariar na sociedade que a envolve meios de subsistência á própria escola.
É evidente que “não há almoços á borla”… e os pais que integram as Comissões de Pais, além do que já foi dito, mais não fazem que garantir a segurança e a transição de ano dos seus rebentos.
Ainda não conheci uma criança dessas que não tenha transitado…
O que vem mostrar a desorganização do sistema e a confusão existente.

Salvo melhor opinião, os professores devem dedicar-se a actividades lectivas e de gestão da própria escola; os alunos devem estudar e serem-lhes concedidas todas as oportunidades e condições de aprendizagem; os pais devem assegurar a educação (princípios de vida, de sã convivência, de aprendizagem da diferença e de democracia, de respeito dos seus direitos e dos direitos alheios) dos seus filhos; finalmente, ao Ministério cabe a obrigação inalienável de arquitectar um sistema educativo funcional, lógico, que valorize todos os intervenientes, que os integre e os forme para a sociedade, que assegure a todos os que tem capacidade e vontade de seguir os estudos as melhores condições de excelência, não descurando a obrigatoriedade de formar em estabelecimentos, apetrechados para o efeito, de todos aqueles que pretendam enveredar por vias profissionais e técnicas.

Não é isto, de todo, que assistimos… infelizmente!

Foi decretado que todos, sem excepção, têm que ser doutores, embora o canudo de pouco lhes sirva ou, no mínimo têm que andar a penar inutilmente pelos corredores escolares sem proveito nem glória…saindo da escola com um certificado que de nada serve.

Se antigamente um burro carregado de livros era um doutor… hoje nem o carregamento de livros, em alguns casos, estabelece qualquer diferença entre uns e outros.
A situação é tão lamentável que quem queira singrar, estando habilitado com grau académico, tem que obter pós-graduação em qualquer universidade britânica, francesa ou americana. Ou seja, a excelência, a disciplina e a exigência que deveriam ser componentes obrigatórias do sistema são adquiridas… no estrangeiro.

Acresce, como sempre, que como não nos é dado valor no nosso país ou, quem tem ideias e vontade de progredir e investigar é, regra geral, tido por lunático e estúpido ambicioso, acabamos por exportar as nossas melhores capacidades do mesmo modo que exportámos (e continuamos a fazê-lo…) mão de obra que honra não só a produtividade, a capacidade inventiva e a adaptabilidade do trabalhador português que só não é reconhecido por essa súcia de sumidades a que alguns chamam, pomposamente, empresários portugueses.
Daí que a “ideia” (infeliz e preconceituosa) de Manuela Ferreira Leite relativamente á ajuda no combate ao desemprego em Cabo Verde e na Ucrânia que o nosso país proporciona, seja uma aberração proveniente de alguém com vestígios de alguma doença degenerativa…
Angola, África do Sul, Espanha, Reino Unido… e outros são grandes auxiliares da luta contra o desemprego em… Portugal!

O dramático é que não disse… que exportamos a nossa classe média, bons cérebros, iniciativa e importamos mão de obra barata e ilegal, na maior parte dos casos.
Na verdade ninguém esperava esse rasgo…

Voltando atrás… á educação e ao sistema de ensino deve ser repensado tudo.


-Pré-primário
-Primário
-Secundário (Liceal ou Técnico)
-Superior

-Gestão da escolas pelos professores
-Responsabilização do ministério por todos os aspectos de apoio regulamentar, logístico, lectivo e organizativo
-Acompanhamento das actividades por parte dos pais
-Garantir o cumprimento obrigatório de todos os programas

-Cultura de exigência
-Prémios á excelência
-Exames nacionais exigentes em cada fim de ciclo
-Retoma dos incentivos ao estudo que eram as “Dispensas de Exame” a partir de determinado nível de aproveitamento de excelência

-Criação de Escolas Técnicas para as várias opções vocacionais, devidamente apetrechadas tecnológica e humanamente
-Voltar a criar condições á dignificação da actividade lectiva
-Assegurar segurança e dignidade ao espaço escolar
-Não recear as medidas adequadas disciplinares ou outras que tenham que ser tomadas
-Adequar a escola ao ambiente envolvente e á composição étnica e cultural
-Promover a integração e o desenvolvimento

-Admitir que a única forma justa (e eficiente) de avaliar os professores é através dos resultados obtidos pelos alunos, em absoluta equidade, com provas nacionais e anuais.
-Promover incentivos á assiduidade dos professores criando forma integrada de avaliação, conjuntamente com os resultados lectivos


Quem discorda???
Quem tem medo???


Nós conseguimos fazer um país melhor??? Claro que conseguimos…
Como??? Só a educação e a formação o permitem.

De que raio estamos á espera???

no baloiço da manhã


























xxxxxxxxxxxxxxxxxxà ducha



(se a cor
da ilha de luanda
namora a traça
da tua saia)
o beija-flor
alimenta-se da tua flora
e a infinita violeta
lambe a espada
a nuvem da prata
ilude a traça
na manhã do teu baloiço




Fernando Kafukeno

Rebita























Foto de "Angola em fotos"




Mulata da minha alma
batuque dos meus sentidos,
meus nervos encandecidos
vibram por ti, sem ter calma.

Por isso vou á rebita,
quase triste e indeciso,
a queimar minha desdita
nas chamas do teu sorriso.

E, triste, assim, vou dançar,
vou dançar e vou beber
o vinho do teu olhar,
que me faz entontecer.

Ouvindo, longe, tocar
o quissange do gentio,
que vive, além no palmar,
onde corre o verde rio!

E depois adormecer
na tua esteira de prata,
onde quero, enfim, morrer,
oh minha linda mulata.

..........................................

Mulata da minha alma,
batuque dos meus sentidos...

Por isso vou á rebita,
quase triste e indeciso,
a queimar minha desdita
nas chamas do teu sorriso.



Tomaz Vieira da Cruz

Em 12 dias...

A esperança


























A sorte de a estupidez (...) não ser mortal








A perda




















O grito de revolta...

















O silêncio (que já vimos noutras ocasiões)




















A "falta de comparência"























Quando todos estão contra... não significa que estejamos no caminho certo!

Angola























Os bardos estão dormentes
- mau sintoma -
os bardos estão desiludidos
pela certa.

Os bardos não estão gritando
ao mundo
o sofrimento do povo
nem denunciando.

Nem exigindo
paz
nem dizendo à juventude
que é preciso erguer-se.

Os bardos estão calados
- mau sintoma -
os bardos estão desiludidos
pela certa.

Mas terão de ser eles
a soltarem em catadupas
o amor patriótico
a fé, nos valores defendidos
dos que lutaram
para que houvesse o 11 de Novembro
afirmando
que das cinzas ressurgirá
a voz indómita do povo.

Desta agonia
deste pesadelo
Angola saíra triunfante
por sobre as valas comuns.

No decurso da humanidade
a luta entre o bem e o mal
foi uma constante
o bem foi sempre abrindo caminhos de amor.



Eugénia Neto

O gemido das palmas das mãos
















Foto de Paulo Ribeiro, aqui



O sol nasceu nas palmas das mãos
no gemido das palmas das mãos do sol
e as palmas das mãos ficaram com manchas solares frias.
Contaram-se os dias nos dedos das palmas das mãos frias
nasciam e cresciam
os dedos do sol ardiam
e as palmas das mãos morriam.



António Pompílio

O feitiço da boca



















-Umbanda wamela okuha.
(O feitiço da boca é o silêncio)

Sentado na Kitanda o tempo é um
cavalo a trote na arquitectura
futurista do meu pensamento

Diria para o Tirso, ó meu santo
este café na baixa e um bagaço
fazem da Kitanda um paraíso

Diria mesmo que no céu há peixes
que também toma café estrangeiros
em busca de uma Sagrada Esperança

diria se o vento não soubesse
que o feitiço da boca é o sinal
de silêncio na pele do tempo


(Tomando café na Kitanda das Letras com o Lopito)



José Luís Mendonça

Meditemos

























"Não importa o que o passado fez de mim. Importa o que eu farei com o que o passado fez de mim."



Jean-Paul Sartre

Se o Amor voltasse



















Eu sei que o amor
nos visitou
mas nós não estávamos
atentos

Tínhamos dezoito anos
e éramos velozes
como os corcéis na pradaria
e efémeros como as flores
que morrem
na estação das chuvas

Hoje se o amor voltasse
eu sei que o reconheceríamos
pela ansiedade
que provoca
e pelo brilho que nos deixa
no olhar

Mas maduros
talvez não o aceitássemos
porque lavrado
o seu incêndio
sobre os meridianos
do coração
pouca certeza teríamos
de sobreviver.


Rui Augusto

Tristeza

























Quando um dia
Despertares
Dessa infausta letargia
E compreenderes
A febre da ambição que me consome…

Quando entenderes

A expressão triste do meu olhar
Amargurado
Fitando o espaço
Numa ansiedade interminável

Quando souberes

Porque contemplo assombrado
O mar,
E invejo as aves que esvoaçam
Livremente pelo ar…

Ah … Então, Sim,

Nesse dia
Farto e desejado
Sentirás o coração palpitar
A maldição
De um ser aviltado
Que clama protecção



Beto Van-Dúnem

Poemas ao sol
















Poema II


O sol da minha terra
o seu tamanho
entra em todos os olhos
mesmo nas fundas cacimbas sem futuro
é a única oferta

O sol da minha terra
o seu calor
arde em todos os peitos
aquele fogo lento das massuíkas
é o único alimento

O sol da minha terra
acende em todas as coisas
as cores do céu folhas musseque
é a única pureza.

O sol da minha terra
por vezes é também
um relâmpago ao meio dia
e queima as sombras dos homens.

O sol da minha terra!

O sol da minha terra!



Arnaldo Santos

Concessão
















Foto de Vladimir Borowicz, via "O Jumento"



o laço soltou-se...
e teus cabelos envolveram-te
as costas, o busto
deixando tão só ranhuras
por onde assomavam
em gesto presente
teus mamilos

o laço desfez-se
quando disseste:
... entra em mim!


Roderick Nehone

Uma perna perdida

















(Mbanza Congo)





A perna
decapitada pela energia
da explosão
da mina
disse adeus ao dono
e partiu
no fumo

Uma perna
camuflada
rota
escondendo seu pé
numa bota
esburacada
anda pedindo esmolas
pela rua

Leva no sangue
que das suas veias
escorre
o percurso do dono
que recorre
recuando o tempo

Já trepou caminhões
desceu
andou aos empurrões
cresceu
pela parada marchou
subiu
nos gabinetes entrou
fugiu
nos musseques pululou
rugiu
de tristeza chorou
e sumiu

Sumiu dos escombros
do que fora seu tugúrio
uma perna fardada
tomou de assalto a marginal
e desfilou
sonhou!

Sonhou
a perna dilacerada
encostada
no verde do semáforo
apagado
na cidade queimada
Sonhou
de boca aberta
ao pó
dos 4x4 fumegando
luxo e distância

Uma perna
rasga a paz urbana
e viola o sono da seda
que veste o perfume
exalado
de seus ex-camaradas

Decapitada uma perna
pela energia da explosão
vermelha uma lanterna
parindo a luz
do dia

Que se apague para sempre
a penumbra
do olhar!



Roderick Nehone

Símbolo


















O formato daquele berço foi um símbolo
O menino em miragens impossíveis
dormia sonhando com navios de papel
enquanto eu contemplava
a cismar,
o conjunto daquela harmonia
sumindo-se na linha do mar.

Navio-berço de menino crioulo
navio-guia que ficou sem ir
“navio idêntico ao navio da nossa derrota parada”.



Luís Romano
In “Clima”

Estou escondido na cor amarga do fim da tarde



















estou escondido na cor amarga do
fim da tarde. sou castanho e verde no
campo onde um pássaro
caiu. sinto a terra e orgulho
por ter enlouquecido. produzo o corpo
por dentro e sou igual ao que
vejo. suspiro e levanto vento nas
folhas e frio e eco. peço às nuvens
para crescer. passe o sol por cima
dos meus olhos no momento em que o
outono segue à roda do meu tronco e, assim
que me sinta queimado, leve-me o
sol as cores e reste apenas o odor
intenso e o suave jeito dos ninhos ao
relento



Valter Hugo Mãe
in "Estou escondido na cor amarga do fim da tarde"

Agora eu era linda outra vez























Foto de Angola em Fotos





Agora eu era linda outra vez
e tu existias e merecíamos
noite inteira um tão grande
amor

agora tu eras como o tempo
despido dos dias, por fim
vulnerável e nu, e eu
era por ti adentro eternamente

lentamente
como só lentamente
se deve morrer de amor




Valter Hugo Mãe
in «O Resto Da Minha Vida seguido de A Remoção das Almas»

Joueur de balafon



Fantástico!

Meditemos






















Paulina Chiziane





“Sei que devo modificar o ambiente pela força de meu espírito por que às preces aos deuses homens ou aos deuses mulheres, quer sejam feitas em voz alta ou silenciosa, as únicas respostas que se obtêm são silêncio absoluto.”



Paulina Chiziane

Quem muito viu























Foto de Nuno Santos, aqui





Quem muito viu, sofreu, passou trabalhos,
mágoas, humilhações, tristes surpresas,
e foi traído, e foi roubado, e foi
privado em extremo da justiça justa;

e andou terras e gentes, conheceu
o mundo e submundos; e viveu
dentro de si o amor de ter criado;
quem tudo leu e amou, quem tudo foi-
não sabe nada, nem triunfar lhe cabe
em sorte como todos os que vivem.
Apenas não viver lhe dava tudo.

Inquieto e franco, altivo e carinhoso,
será sempre sem pátria. E a própria morte,
quando o buscar, há-de encontrá-lo morto.



Jorge de Sena
in "Poesia, Vol III"

Terra molhada



















Não vou negar a saudade
De tantos cheiros impregnada;
Mas daqueles que me lembro
Há um, deixa-me assim arrasada...

Terra molhada, cheirosa
Que não mais vou esquecer...
Dos quentes verões chuvosos
Não se cansa de beber...

Por momentos, por instantes,
Quem me dera tal sentir,
Dar de beber à minha alma
Sequiosa de partir...


Ana Bela