Uma perna perdida
quinta-feira, outubro 16, 2008
(Mbanza Congo)
A perna
decapitada pela energia
da explosão
da mina
disse adeus ao dono
e partiu
no fumo
Uma perna
camuflada
rota
escondendo seu pé
numa bota
esburacada
anda pedindo esmolas
pela rua
Leva no sangue
que das suas veias
escorre
o percurso do dono
que recorre
recuando o tempo
Já trepou caminhões
desceu
andou aos empurrões
cresceu
pela parada marchou
subiu
nos gabinetes entrou
fugiu
nos musseques pululou
rugiu
de tristeza chorou
e sumiu
Sumiu dos escombros
do que fora seu tugúrio
uma perna fardada
tomou de assalto a marginal
e desfilou
sonhou!
Sonhou
a perna dilacerada
encostada
no verde do semáforo
apagado
na cidade queimada
Sonhou
de boca aberta
ao pó
dos 4x4 fumegando
luxo e distância
Uma perna
rasga a paz urbana
e viola o sono da seda
que veste o perfume
exalado
de seus ex-camaradas
Decapitada uma perna
pela energia da explosão
vermelha uma lanterna
parindo a luz
do dia
Que se apague para sempre
a penumbra
do olhar!
Roderick Nehone
A vida é na verdade muito cruel!