O céu é aquela clareira



















o céu é aquela clareira
onde deito os olhos com ténues
cambiantes de cor que quase
gasto nas mãos, e como. como
o céu e aguardo uma
digestão convulsa. enquanto
o aguaceiro seca na terra antes que o
possa beber e deus se
vinga de mim ditando
os versos que escondem
a água ao mundo. já as
fogueiras florindo em volta,
murchando o dia que me
persegue. uma intervenção
divina para me resistir



Valter Hugo Mãe
In “estou escondido na cor amarga do fim da tarde”

Meditemos
















"O homem sensato adapta-se ao mundo. O homem insensato insiste em tentar adaptar o mundo a si. Sendo assim, qualquer progresso depende do homem insensato"



Bernard Shaw

Louca Simbiose





















Quando as palavras em cúpula morfológica
Lacrimejam e ferem o papel
Ganha corpo a poesia

quando as palavras nuas nas andanças
em louca simbiose choram e cantam

a poesia banha o espiríto de conforto.



Flas Ndombe

Les feuilles mortes





















Oh! Je voudrais tant que tu te souviennes
des jours heureux où nour étions amis
En ce temps-là la vie était plus belle
et le soleil plus brûlant qu'aujourd'hui
Les feuilles mortes se ramassent à la pelle...
Tu vois je n'ai pas oublié
Les feuilles mortes se ramassent à la pelle
les souvenirs et les regrets aussi
et le vent du nord les emporte
dans la nuit froide de l'oubli
Tu vois je n'ai pas oublié
la chanson que tu me chantais

C'est une chanson qui nous ressemble
Toi tu m'aimais
et je t'aimais
Et nous vivions tous deux ensemble
toi qui m'aimais
et que j'aimais
Mais la vie sépare ceux qui s'aiment
tout doucement
sans faire de bruit
et la mer efface sur le sable
les pas des amants désunis...

Mais mon amour silencieux et fidèle
sourit toujours et remercie la vie
Je t'aimais tant tu étais si jolie
Comment veux-tu que je t'oublie
En ce temps-là la vie était plus belle
et le soleil plus brûlant qu'aujourd'hui
Tu étais ma plus douce amie...
Mais je n'ai que faire des regrets
Et la chanson que tu chantais
toujours toujours je l'entendrai

C'est une chanson qui nous ressemble
Toi tu m'aimais
et je t'aimais
Et nous vivions tous deux ensemble
toi qui m'aimais
et que j'aimais
Mais la vie sépare ceux qui s'aiment
tout doucement
sans faire de bruit
et la mer efface sur le sable
les pas des amants désunis



Jacques Prévert


2.ª Transparência (falando do amor)





















Falo do amor
que te rouba e devolve o sangue
que é guerra e paz contínua
alívio e desgraça permanente
falo do amor que não é sexo

falo do amor
que se manifesta nas unhas
que são suores e pelos em chamas
sobrancelhas e tacto em ebulição
falo do amor que não é carne

falo do amor
poliglota, desconhecendo raça e crença
que é um oceano de emoções
que é cicatriz sem ter ferida
falo desse amor que é sexo

falo do amor
interplanetário e atómico
(neutrões, protões e iões em contradição aparente)
naves e corações que descolam
como transitam os símbolos no Zodíaco
falo desse amor que não é carne

falo do amor
que é renascimento
como alguém que atirando pedras ao charco
se vai banhando por dentro
enquanto por fora
o seu tamanho se confunde com o mundo
falo desse amor que não é sexo

falo do amor
que não é língua
mas a saliva
abundante mãos
falo desse amor que é carne…



António Gonçalves

Não tenho retratos amarelecidos

























Foto de "Angola em fotos"




não tenho retratos amarelecidos
dos meus antepassados
não tenho jazigos de família
nem diários escondidos no baú do sótão

não tenho medalhas herdadas
nem sei das fomes dos meus avôs chicoteados
e das revoltas das minhas avós
silenciadas

não tenho escrúpulos a esquecer
para ser aquilo que sou
aqui
neste meu lugar no mundo

não tenho que aplaudir as botas
que esfrangalham o meu jardim
nem tenho de acenar
em janela alguma
ao festejo de mais uma comemoração

ao sol diário do meio-dia
revivo o gosto que tenho
desta certeza
de país
em construção



João Abel

Dime porque (tu te vas)





A primeira vez que eu te vi…
Algo muito forte eu senti…
Eu toquei o céu…
Percorri o mar…
Noites de luar…
não dormi…
Sonho acordado a pensar
A maneira de me aproximar
Do teu coração, ternura e paixão
Mas agora sei que foi em vão
Porque se eu pudesse antever…
O que depois iria acontecer
Não me apaixonava , te atacava… entregava…
Meu coração… sem competição…
Se entregou a ti…confiou em ti…
Mas agora sei que foi em vão…

Dime porque tu te vas… Quando yo te quiero mas…
Aunque te quiero… so no me quiedo…
Que vas e no volveras…
Dime porque tu te vas… Quando yo te quiero mas…
Aunque te quiero… so no me quiedo…
Dime porque tu te vas… assim…

Em ti confiei… também depositei
Toda a confiança e esperança por te amar me enganei…
Mas jamais eu me culparei
Por te dar aquilo que te dei
Eu te dei porque acreditei…
e me apaixonei… Me apaixonei
Será que exagerei
Por te amar como amei
Sera que sofoquei
Por te dar o que eu te dei
Sei que não exagerei sofoquei alias
Amor que é amor nunca e demais
Pois quem ama quer sempre mais

Dime porque tu te vas… Quando yo te quiero mas…
Aunque te quiero… so no me quiedo…
Que vas e no volveras…
Dime porque tu te vas… Quando yo te quiero mas…
Aunque te quiero… so no me quiedo…
Dime porque tu te vas… assim…

Diz me porque… diz…
Sinto tanto a tua falta…

Pero dime se te vas
Pero dime se te vas
Tu me esto a terra e el cielo
Me dice te que me quieres

Dime porque tu te vas… Quando yo te quiero mas…
Aunque te quiero… so no me quiedo…
Que vas e no volveras…
Dime porque tu te vas… Quando yo te quiero mas…
Aunque te quiero… so no me quiedo…
Dime porque tu te vas… …
Dime porque tu te vas… Quando yo te quiero mas…
Aunque te quiero… so no me quiedo…
Que vas e no volveras…
Dime porque tu te vas… Quando yo te quiero mas…
Aunque te quiero… so no me quiedo…
Que vas e no volveras…


SSP

Corpo de mulher

























"Corpo de mulher, alvas colinas, coxas brancas,
ao mundo te assemelhas em teu ato de entrega.
O meu corpo selvagem de camponês te escava
e faz saltar o filho das entranhas da terra!"



Pablo Neruda

As ruas correm


















As ruas correm
largas e frescas
dentro de mim.
Rompe-se a crisálida
do dia.
O céu cresce em meu peito
gigantesca borboleta
pelo amor desenhada.
A vida torna-se bonita
como uma mulher
que se descobre no espelho.



Jurema Barreto de Souza

O teu olhar




















O teu olhar
fala-me de viagens
e lugares distantes.
O teu olhar
fala-me de solidão
em certos instantes.
O teu olhar
fala-me de saudade
e de doçura.
O teu olhar
fala-me de desejo
e de quentura.
O teu olhar,
caminhante em mim...


Jacky, do "Amorizade"

És a vela içada

























És a vela içada
a quilha que contorna
a carne das águas.
És a tempestade
a chuva premeditada
e eu o náufrago
que não se permite afogado.





Eduardo White

Para ti























Foi para ti
que desfolhei a chuva
para ti soltei o perfume da terra
toquei no nada
e para ti foi tudo

Para ti criei todas as palavras
e todas me faltaram
no minuto em que falhei
o sabor do sempre

Para ti dei voz
às minhas mãos
abri os gomos do tempo
assaltei o mundo
e pensei que tudo estava em nós
nesse doce engano
de tudo sermos donos
sem nada termos
simplesmente porque era de noite
e não dormíamos
eu descia em teu peito
para me procurar
e antes que a escuridão
nos cingisse a cintura
ficávamos nos olhos
vivendo de um só olhar
amando de uma só vida.




Mia Couto

Nas algas

















Foto de Manuel Gonçalves em Olha oh Passarinho




Devolvidos em caracteres não descodificados
Jazem nas algas
Recados produzidos além
Como repousassem para futuras leituras.
Cartas antigas. Heroismo e amor.
Contos perdidos na história e sonhos cantados
Em papel de cambraia
Socegadamente dormem no dorso das algas.
Amanhã será o dia maior.
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxO da leitura final



Garcia Bires

Vens de um tempo...











vens de um tempo ardendo por dentro
mas as tuas mãos não se cansam de florir desejos
quando eu te encontro tranquilamente
na exploração das ondas de todos os oceanos.
goteja
xxxxx a
xxxxxxx lâmina
amor!


E. Bonavena

A maior riqueza

























Dentro de poucas horas iniciar-se-á a votação nas Eleições Legislativas em Angola.
Ouço com apreensão as notícias da TSF.

Há 16 anos significou o regresso da guerra.

Angola é riquíssima.
A imensa riqueza que possui pode proporcionar aos seus filhos uma vida digna que faça esquecer todos os sacrifícios por que teve que passar.

Angola tem, sobretudo, um povo soberbo.
Um povo magistralmente retratado em Angola em fotos - o retrato da Angola real, fraterna, leal, solidária e amiga - a Angola que não aparece nos postais da baía ou nas fotos obtidas do terraço do Hotel Presidente.

Esse povo orgulhoso, corajoso e sofredor constitui a sua maior riqueza.
Os seus dirigentes, todos eles, esquecem-no sistemáticamente.
Por uma vez devem lembrar-se dessa riqueza e respeitá-la.

Quando o petróleo e os diamantes tiverem acabado ficará o povo.

Quaisquer que sejam os resultados do veredicto desse magnífico povo, honrem-no!
Respeitem e não desbaratem essa riqueza imensa.

Chama quente
















Gosto de ti apaixonadamente
De ti, és a vitória, a salvação
De ti que me trouxeste pela mão
Até o brilho desta chama quente

A tua linda voz de água corrente
Ensinou-me a cantar... e essa canção
Foi ritmo nos meus versos de paixão
Foi graça no meu peito de descrente

Bordão a amparar minha cegueira,
Da noite negra o mágico farol,
Cravos rubros a arder numa fogueira!

E eu, que era no mundo uma vencida
Ergo a cabeça ao alto, encaro o sol!
― Águia real, apontas-me a subida!



Florbela Espanca








Raimundo Fagner

Encosta-te a mim...





Encosta-te a mim,
nós já vivemos cem mil anos
encosta-te a mim,
talvez eu esteja a exagerar
encosta-te a mim,
dá cabo dos teus desenganos
não queiras ver quem eu não sou,
deixa-me chegar.
Chegado da guerra,
fiz tudo p´ra sobreviver em nome da terra,
no fundo p´ra te merecer
recebe-me bem,
não desencantes os meus passos
faz de mim o teu herói,
não quero adormecer.

Tudo o que eu vi,
estou a partilhar contigo
o que não vivi, hei-de inventar contigo
sei que não sei, às vezes entender o teu olhar
mas quero-te bem, encosta-te a mim.

Encosta-te a mim,
desatinamos tantas vezes
vizinha de mim, deixa ser meu o teu quintal
recebe esta pomba que não está armadilhada
foi comprada, foi roubada, seja como for.
Eu venho do nada porque arrasei o que não quis
em nome da estrada onde só quero ser feliz
enrosca-te a mim, vai desarmar a flor queimada
vai beijar o homem-bomba, quero adormecer.

Tudo o que eu vi,
estou a partilhar contigo o que não vivi,
um dia hei-de inventar contigo
sei que não sei, às vezes entender o teu olhar
mas quero-te bem, encosta-te a mim

Encosta-te a mim
Encosta-te a mim

Quero-te bem.

Encosta-te a mim.



Jorge Palma