Sorrisos mutilados

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Imagem daqui


"No meu país
a (in)competência doentia
mutila-nos o sorriso
e nós teimosamente
arranjamos muletas e sorrimos
deitados à sombra da esperança
esculpida pela nossa paciência
Coragem, gente
pois galopa celere o instante
em que sorriremos sem muletas!"


Carlos Zimba

Ocorre-me agora

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"Ocorre-me agora
a pupila minúscula de uma criança.
A sua engenharia
desde o corpo na guerreira pequenez
ao dedo provador da boca.
Ocorre-me esta criança
este monge da franqueza em seu templo de inocência.
Amo-a. Vivo-a.

Voar é poder amar uma criança.
Sonhar-lhe o peso no colo, as mãos acariciantes
sobre a palma da alma.

Voar é tardar a boca
na rosa do rosto de uma criança.
Pronunciar-lhe a ternura,
a seda fresca e pura
da sua infância.

Voar é adormecer o homem
na mão sonhadora
de uma criança."


Eduardo White

Imagens e palavras de Abril

De Abril, imagens mil.
Amigos, resolvi hoje partilhar convosco as que mais me marcaram... porque são elas que povoam o imaginário, alimentam o sonho e dão força e coragem.

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Salgueiro Maia

O homem que ajudou a sonhar o ideal, que o ajudou a planificar, que o construiu a golpes de coragem, coerência e audácia...
Aquele que na voragem da demagogia sempre se manteve sereno e coerente, recusando todas as honrarias que outros procuraram e conseguiram, esforçada e imerecidamente.
Simbolo maior do que todos sonhamos naquela madrugada.

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Francisco Sousa Tavares

Coragem e coerência na luta pela Liberdade. Não receou nunca dizer o que pensava, mesmo quando o passaram, muitas vezes a apelidar de reaccionário. Foi exemplo de coragem no dia 25 de Abril, na direcção de «A Capital» e em tantos outros momentos. Aprendi a respeitar mesmo não concordando. Um vulto incontornável e um exemplo.

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Nós, o povo

Que cedo largamos o torpor de um sono de 48 anos para vivermos e sonharmos, mesmo que fugazmente fosse, o inebriante sabor da Liberdade.
Que vimos Salgueiro Maia arriscar-se em nosso nome, que vimos Sousa Tavares incitar-nos... não ficámos em casa...
Fomos os grandes vencedores!
Quem sabe se não tivessemos saído á rua, os pretores da «Brigada do Reumático» que assumiu o poder das mãos dos Capitães, não teriam alterado o rumo dos acontecimentos!
Fomos nós que impedimos a confrontação por demonstrarmos de forma cabal a adesão.
Saímos, lutámos e vencemos.
Unidos.



A Rapariga do País de Abril

Habito o sol dentro de ti
descubro a terra aprendo o mar
rio acima rio abaixo vou remando
por esse Tejo aberto no teu corpo.

E sou metade camponês metade marinheiro
apascento meus sonhos iço as velas
sobre o teu corpo que de certo modo
é um país marítimo com árvores no meio.

Tu és meu vinho. Tu és meu pão.
Guitarra e fruta. Melodia.
A mesma melodia destas noites
enlouquecidas pela brisa no País de Abril.

E eu procurava-te nas pontes da tristeza
cantava adivinhando-te cantava
quando o País de Abril se vestia de ti
e eu perguntava atónito quem eras.

Por ti cheguei ao longe aqui tão perto
e vi um chão puro: algarves de ternura.
Quando vieste tudo ficou certo
e achei achando-te o País de Abril.


Manuel Alegre
30 Anos de Poesia
Publicações Dom Quixote


Esta homenagem e partilha dedico-a por inteiro a amigos(as), paladinos e amantes da Liberdade como eu.
Á IO, ao Pululu, ao João Tunes, á Margem, ao António, ao jpt, á Brigida, á Laurindinha, ao Mussele, ... e a tantos, tantos amigos que me têm honrado com a sua visita e que agora, nesta hora, tão injustamente não lembro... mesmo para aqueles que tendo opinião diversa por aqui passam e que deixam o rasto da sua simpatia e opinião só permitida por essa gesta colectiva que iniciámos, com todas as virtudes e erros naquela madrugada.

25 de Abril

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25 de Abril de 1974… estava em São Salvador do Congo (hoje Mbanza Congo), dia cinzento que adivinhava já a chegada do cacimbo. Estava a estudar, sozinho, na antiga capital do Reino do Congo, os meus pais e a minha irmã estavam em Ambrizete (hoje Nzeto).
Dia de aulas perfeitamente normal mas, a meio da manhã, começou a sentir-se no ar algum nervosismo.
A maioria dos professores(as) eram ou ex-militares ou esposas de militares e por isso tiveram cedo acesso a algumas notícias «desencontradas» que algo de anormal se passava na metrópole…
Á tarde a notícia corria célere…mas ninguém se arriscava a confirmar nada.
Como à IO, foi da rádio sul africana que foram chegando notícias que confirmavam não apenas o movimento mas a sua vitória.
Intimamente uma imensa alegria…. Uma esperança sem fim que tudo iria melhorar para todos.
Com o golpe de estado iriam embora os receios do antigo senhorio, na longínqua Brandoa, que em surdina vociferava, perante a bonomia do meu pai, contra Salazar… ou acabavam os receios do que pudesse ser dito aquando da visita daquele nosso vizinho, nos Olivais dessa distante Lisboa.
Ficariam longe as noites de Natal em que haveria prevenção rigorosa em vez de haver ceia com bacalhau, como ficariam longe igualmente as recordações de noites que, em vez de passadas a desembrulhar um ou outro livro de presente, as passei «a brincar» com uma G3 na mão, porque de Brazzaville a rádio, em ondas curtas, ameaçava, como sempre, o ataque fulminante a São Salvador, embora ninguém acreditasse nisso.
Assim, em zona de guerra, onde se ouve tudo e mais alguma coisa, não era segredo para ninguém, nem para um puto de 16 anos, que de um modo ou outro algo teria que acontecer.
Há cerca de dois anos que se falava com certo á vontade na possibilidade de Angola se libertar da metrópole, aceder á independência tornando Nova Lisboa (Huambo) sua capital.
Recordo que no dia seguinte, antes da primeira aula, a turma resolveu arranjar um emblema… e desenhá-lo no quadro! Que bela bronca ouviu o Cacusso por isso e sobretudo por ter integrado na sua composição estrelas de 5 pontas…
Recordo, e lamento ter perdido, as primeiras cartas (aerogramas) que troquei com o meu pai, então comandante da Esquadra da PSP em Ambrizete. Eu, eufórico pelos acontecimentos… ele, desconfiado e contundente com os militares afirmando que «nunca fazem nada de jeito, nem a marcar passo…»
Vindo dele e sendo representante de uma estrutura que sempre nutriu, mesmo que em surdina, um ódio de estimação aos militares, por entenderem ser a corporação uma polícia com características cívicas e não militares… não dei importância, mas registei, claro.
Vi, empolgado, emocionado e com «pele de galinha» no ecran do CRESSA (Clube Recreativo de São Salvador) as imagens do primeiro 1º. de Maio que nunca mais ninguém esqueceu.
E tive esperança… por mim, por todos e sobretudo por todos aqueles que me rodeavam, colegas e amigos, porque tornou-se óbvio para todos que a guerra, de um modo ou de outro, teria os dias contados.
Tive esperança. sobretudo por eles… o meu caminho, a curto prazo, já sabia não passar pela continuação em Angola. A comissão do «velhote» estava a terminar e o regresso acabou por acontecer em Setembro de 74.
Todos tínhamos esperança que a emancipação de Angola ocorresse longe de outros exemplos vizinhos.
A madrugada de 25 de Abril serviu para podermos sonhar…
E sonhámos!
E idealizámos!
E construímos!
Por entre sonhos e pesadelos, muito foi realizado…
Houve feridas abertas… incompreensões…
Responsabilidades assumidas e outras alijadas…
Responsabilidades ás consequências e não ás causas…
Houve dores de «crescimento».
Mas... valeu a pena!
Viva o 25 de Abril!

Árvore de frutos


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Cheiras ao caju da minha infância
e tens a cor do barro vermelho molhado
de antigamente;
há sabor a manga a escorrer-te na boca
e dureza de maboque a saltar-te nos seios.

Misturo-te com a terra vermelha
e com as noites
de histórias antigas
ouvidas há muito.

No teu corpo
sons antigos dos batuques à minha porta,
com que me provocas,
enchem-me o cérebro de fogo incontido.

Amor, és o sonho feito carne
do meu bairro antigo do musseque!


António Cardoso

Lembrança


Cão Pequeno, São Tomé - Foto de João Alves em Caminhadas e Descobertas em STP Posted by Hello


Passa um vento morno,
Um vento morno
Na trémula palmeira,
Na neblina prateada.

Envoltos na ténue distância
Morros azuis de mata
Lá ao longe.
Algures um sino suave tange.

No vento ondula como flâmula
Uma saia berrante cor de sangue.

Árvores de fruta pão
Bailando, mãos abertas,
Leques de bananeiras
Oscilando lentamente.

Visão fugidia, retratada
Por inteiro
No livro silencioso da memória.

Lembrança de São Tomé,
Sangué, trémula e prateada...

Saudade de São Tomé...


Neves e Sousa

Espero


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Por ti espero
desde que partiste
e aguardo o teu recado
em cada pessoa que chega;
Olho para os caminhos
todas as manhãs
na esperança de nos encontrarmos.

O cacimbo passou.
Nova folhagem cobrirá
daqui a pouco
a floresta
e tu não vens.
Depois
serão as chuvas...

De tanto te esperar
já sonho que chegaste.
Desperto ao latir dos cães
julgando ter chegado
quem vem bater-me à porta.
Esta esperança vã
é um tormento que em mim cresce
dia a dia.


Raul David
(Cantares do nosso povo)
(origem Ovimbundu)


In Casa de Angola

Morreu escritor angolano Raul David, autor de "Colonizados e Colonizadores"
O escritor angolano Raul David, 87 anos, morreu no passado dia 20 à noite, na cidade do Lobito, província de Benguela, vítima de doença.


"É uma biblioteca que desaparece, perdemos uma enciclopédia viva do passado colonial", afirmou o ministro angolano da Cultura, Boaventura Cardoso, em declarações à Rádio Nacional de Angola, numa referência à tradição africana que considera os idosos como bibliotecas de sabedoria.
O ministro angolano referiu-se ainda à obra mais conhecida de Raul David, intitulada "Colonizados e Colonizadores", considerando tratar-se de "um livro que é uma referência da literatura angolana, que trata de forma muito particular diversos aspectos do passado colonial".

Raul David nasceu em 1918 na Ganda, município do interior da província de Benguela, onde fez os estudos primários e passou grande parte da sua infância, antes de ingressar no seminário católico de Ngalangui.
O escritor iniciou a sua actividade literária aos 45 anos, mas a sua primeira obra só foi publicada quando tinha 57 anos.
"Colonizados e Colonizadores", publicado em 1974, foi a sua primeira obra publicada, a que se seguiram, entre outras, "Escamoteados na Lei" (1987), "Cantares do nosso povo, cantos em língua umbundo" (1987) e "Crónicas de ontem para ouvir e contar" (1989).
Antes de ser internado devido à doença que veio a provocar a sua morte, Raul David estava a preparar a edição de uma nova obra com diversos textos inéditos.

Chuva

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Outrora
Quando a chuva vinha
Era a alegria que chegava
Para as árvores
O capim
E para a gente.

Era a hora do banho sob a chuva
Meninos sem chuveiro
A água regateada na cacimba
Muitas horas de pé esperando a vez.

Era a alegria de todos, essa chuva:
Porque então fiz o primeiro poema triste?

Hoje ela veio
Veio sem o encanto de outras eras
E ergueu na minha frente o tempo ido.
Porque estou triste?
Porque estou só?

A canção é sempre a mesma
Mesmos os fantasmas, meu amor:
Inútil o teu sol ante os meus olhos
Inútil teu calor nas minhas mãos.
Essa chuva é minha amante
Velho fantasma meu:
Inútil, meu amor, tua presença.


Mário António
(Obra poética)

Sentido de humor


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Noticiou, creio que a TSF, pela Voz de D. José Saraiva Martins que o novo Papa Bento XVI é uma pessoa cheia de sentido de humor, capaz de contar anedotas.

A Kitanda, esta vossa humilde loja, não está em condições de contar nenhuma... mas tem o exclusivo mundial de noticiar quantas anedotas contou na Capela Sistina...

Exactamente... 114!
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Poema de esperança

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... Os pássaros voarão
E o mundo encher-se-á de suas penas

Calados nos ouviremos segredando
Fazendo do horizonte uma linha longa,

Tu tremerás receosa do infinito
Mas eu estarei junto de ti...

E será doce ou triste aquele poente...?
Porém tu me dirás sorrindo:

— Que importa? São tuas as linhas desta mão...


Arnaldo Santos

Maracujá

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Flor de Maracujá, foto de Brigida Rocha Brito em Caminhadas e Descobertas em STP


Um dia
o pé de maracujá
que eu plantei no quintal
cresceu
e floriu

Eu nunca tinha visto
a flor do maracujá.

Juro por Deus nunca vi
coisa mais linda do mundo
do que a flor violeta
do pé de maracujá
que eu plantei
Na cerca do meu quintal

Um dia
o maracujá
que eu plantei no meu quintal
cresceu e floriu...

Ernesto Lara Filho

An eagle when she flies

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She's been there,
God knows, she's been there
She has seen and done it all
She's a woman, she knows how to
Dish it out or take it all
Her heart's as soft as feathers
Still she weathers stormy skies
And she's a sparrow when she's broken
But she's an eagle when she flies
A kaleidoscope of colors
You can toss her around and round
You can keep her in your vision
But you'll never keep her down
She's a lover, she's a mother
She's a friend and she's a wife
And she's a sparrow when she's broken
But she's an eagle when she flies

Gentle as the sweet magnolia
Strong as steel, her faith and pride
She's an everlasting shoulder
She's the leaning post of life
She hurts deep and when she weeps
She's just as fragile as a child
And she's a sparrow when she's broken
But she's an eagle when she flies

She's a sparrow when she's broken
But she's an eagle when she flies
Oh, bless her, Lord
She's an eagle when she flies


Dolly Parton

Ouvir aqui


O Choro de África

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O choro durante séculos
nos seus olhos traidores pela servidão dos homens
no desejo alimentado entre ambições de lufadas românticas
nos batuques choro de África
nos sorrisos choro de África
nos sarcasmos no trabalho choro de África.

Sempre o choro mesmo na vossa alegria imortal
meu irmão Nguxi e amigo Mussunda
no circulo das violências
mesmo na magia poderosa da terra
e da vida jorrante das fontes e de toda a parte e de todas as almas
e das hemorragias dos ritmos das feridas de África

e mesmo na morte do sangue ao contacto com o chão
mesmo no florir aromatizado da floresta
mesmo na folha
no fruto
na agilidade da zebra
na secura do deserto
na harmonia das correntes ou no sossego dos lagos
mesmo na beleza do trabalho construtivo dos homens

o choro de séculos
inventado na servidão
em histórias de dramas negros almas brancas preguiças
e espíritos infantis de África
as mentiras choros verdadeiros nas suas bocas
o choro de séculos
onde a verdade violentada se estiola no circulo de ferro
da desonesta força
sacrificadora dos corpos cadaverizados
inimiga da vida

fechada em estreitos cérebros de máquinas de contar
na violência
na violência
na violência

O choro de África é um sintoma

Nós temos em nossas mãos outras vidas e alegrias
desmentidas nos lamentos falsos de suas bocas - por nós!
E amor
e os olhos secos.


Agostinho Neto

A cor dos teus olhos

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Teus olhos eram a cor
da vida que recusára
anos antes.
Aquele momento
foi o sentido certo,
a dimensão exacta
da palavra amor.

Mais que o sexo
cujo odor pairava
ainda no ar.
Mais que as palavras doces
que me ouves agora.

De verdade, esse momento
teve a magia
de se repetir na dor
da saudade
duma qualquer imaginação
efémera.

Teus olhos são a esperança
da vida que já não esperava
acontecer.
É assim que te quero amar.
Mostrar nos olhos a verdade
que vi nos teus.


António Metelo Dias
02/07/97

Poema da alienação

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African Summer Night, Jeane Granada Coutts


Não é este ainda o meu poema
o poema da minha alma e do meu sangue
não
Eu ainda não sei nem posso escrever o meu poema
o grande poema que sinto já circular em mim
O meu poema anda por aí vadio
no mato ou na cidade
na voz do vento
no marulhar do mar
no Gesto e no Ser
O meu poema anda por aí fora
envolto em panos garridos
vendendo-se
vendendo
ma limonje ma limonjééé”
O meu poema corre nas ruas
com um quibalo podre à cabeça
oferecendo-se
oferecendo
“carapau sardinha matonaji ferrera ji ferrerééé...”
O meu poema calcorreia ruas
“olha a probíncia” “diááário”
e nenhum jornal traz ainda
o meu poema
O meu poema entra nos cafés
“amanhã anda a roda amanhã anda a roda”
e a roda do meu poema
gira que gira
volta que volta
nunca muda
“amanhã anda a roda
amanhã anda a roda”
O meu poema vem do Musseque
ao sábado traz a roupa
à segunda leva a roupa
ao sábado entrega a roupa e entrega-se
à segunda entrega-se e leva a roupa
O meu poema está na aflição
da filha da lavadeira
esquiva
no quarto fechado
do patrão nuinho a passear
a fazer apetite a querer violar
O meu poema é quitata
no Musseque à porta caída duma cubata
“remexe remexe
paga dinheiro
vem dormir comigo”
O meu poema joga a bola despreocupado
no grupo onde todo o mundo é criado
e grita
“obeçaite golo golo”
O meu poema é contratado
anda nos cafezais a trabalhar
o contrato é um fardo
que custa a carregar
“monangambééé”
O meu poema anda descalço na rua
O meu poema carrega sacos no porto
enche porões
esvazia porões
e arranja força cantando
“tué tué tué trrarrimbuim puim puim”
O meu poema vai nas corda
encontrou sipaio
tinha imposto, o patrão
esqueceu assinar o cartão
vai na estrada
cabelo cortado
“cabeça rapada
galinha assada
ó Zé
”picareta que pesa chicote que canta
O meu poema anda na praça trabalha na cozinha
vai à oficina
enche a taberna e a cadeia
é pobre roto e sujo
vive na noite da ignorância
o meu poema nada sabe de si
nem sabe pedi
O meu poema foi feito para se dar
para se entregar
sem nada exigir
Mas o meu poema não é fatalista
o meu poema é um poema que já quer
e já sabe
o meu poema sou eu-branco
montado em mim-preto
a cavalgar pela vida.


António Jacinto

Luanda 1996

Antes de aterrar no Aeroporto 4 de Fevereiro no dia 10 de Abril, há nove anos atrás, tentei recuperar ao máximo tudo quanto recordava de uma cidade espantosa.
Ia comigo a vontade de poder, mesmo que modestamente, contribuir para melhorar a limpeza urbana da cidade.
A minha frieza analítica e profissional e o africanismo, superavam largamente o ruído de fundo constituído por toda a lengalenga da «chapa 5», que o jpt tão bem descreve na sua Ma-Schamba, bem como a ideia estúpida e racista de que «não há pedra sobre pedra».
Luanda, entre a interrupção da Guerra Civil e o seu recomeço era, em 1996, uma cidade que denotava a grandeza que lhe conheci em meados da década de 70 e mostrava abundantemente todas as chagas derivadas dessa mesma guerra e do facto de as infraestruras da cidade, nomeadamente no saneamento, não suportarem mais que as 500.000 pessoas para as quais estavam dimensionadas.
O transporte do aeroporto para o local de acolhimento deu para fazer um primeiro balanço - infraestruras degradadas mas muito longe do cenário caótico que os «profetas da desgraça» sempre traçam.
Relembro desses momentos de reencontro o calor imediato do povo angolano, que já conhecia mas que, no meio de tanta tragédia, julgava ter sido duramente golpeado.
O povo angolano tem um orgulho e uma coragem inacreditáveis.
Recordo a viagem entre a Aeroporto e o local de alojamento e a música que ouvi - Song for Guy, por Elton John. Curioso, porque foram desta melodia os últimos acordes musicais que ouvi em Luanda quando, quatro mese e meio depois, parti.
Tive a felicidade de ficar instalado num «aldeamento» para cooperantes na Estrada de Catete, município de Kilamba-Kiaxi, muito perto já de Viana.
Poderá ser paradoxal dizer isso de um local em que estavamos guardados por «armários», de óculos espelhados, portadores de AK-47.
Tenho, para mim, que estando em contacto directo com o povo e tendo a percepção, por via organizacional das questões tecnicas e profissionais, podia ter uma visão mais perto da realidade do que teria se acaso ficasse, principescamente, instalado nalguma unidade hoteleira.
Verifiquei, na visita efectuada á cidade, nesse primeiro dia que, a limpeza urbana era bastante má mas havia ainda assim uma diferença - a «cidade de alcatrão» apesar de má, estava melhor que as áreas limítrofes, os musseques e os bairros populares.
Fiquei a saber que a minha missão era colaborar nos aspectos organizativos e operacionais da limpeza, no que diz respeito á «cidade de alcatrão».
Verdadeiramente pouco... mas verdade, também, que não havia nem meios, nem tempo para efectuar tudo o que deveria ser realizado.
Os documentos que ficam são aspectos desse trabalho.


.. Posted by Hello

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Sei que muitas alterações ocorreram. A limpeza deixou de estar a cargo da ELISAL. Sei que há muitas melhoria... no centro da cidade. Sei que muito está feito mas há uma imensidão de coisas por fazer. Sei que nos musseques continua quase tudo, invariavelmente, na mesma.

Melhores dias virão.
Sei que Luanda não era uma cidade suja e voltará a ostentar, para o bem dos seus habitantes, um ambiente mais limpo e saudável.

Esta «conversa» toda foi-me «sugerida» pelo post da amiga IO no seu laurentino e espantoso Chuinga pelas diferenças entre Maputo e Luanda.
Tinha que defender aminha «dama»!

Voltarei a Luanda e conhecerei Maputo e igualmente o, dizem, lindíssimo Bilene de quem a minha Maria «morre» de saudades.

Barcos


.. Posted by Hello



"Nha terra é quel piquinino
É São Vicente é que di meu"

Nas praias
Da minha infância
Morrem barcos
Desmantelados.

Fantasmas
De pescadores
Contrabandistas
Desaparecidos
Em qualquer vaga
Nem eu sei onde.

E eu sou a mesma
Tenho dez anos
Brinco na areia
Empunho os remos...
Canto e sorrio...
A embarcação:
Para o mar!
É para o mar!...

E o pobre barco
O barco triste
Cansado e frio
Não se moveu...

Yolanda Morazzo

Novo membro da família... Pôpas

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Pôpas.

A juntar ao Pantufa, ao Misha, ao Miau, ao Marradinhas e ao Maria.
Ainda está com a mãe mas prevejo já reboliço em casa.
Prometo dar notícias e juntar foto melhor (argghh...)

Melhor só mesmo no template do Paquecas, da Maria Papoila.

Virtual

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Você faz nascer poemas de mim
Como filhos de mulher.
Sou sua terra fértil
E você é meu grão.
Oh, meu Deus!!!
Que amor doido é esse
Que me tira os pés do chão?!

Sou princesa, sou fada,
Sou mulher,
Sou a estrela e a lua,
Sou tudo o que você quiser.
Sou sonho, verdade,
Sou virtual, sou real.

Oh!... e esse amor que me bole,
Me dá explosões de alegria
E toneladas de ansiedade.
É você que chega,
Não te vejo,
Não te ouço,
Mas te sinto...

Me viro ao avesso,
Padeço
Faço poemas
E você me endoidece.

Oh!... e esse amor que me dói...
Me corrói,
Dor doída
De vontade de te ver...


Leticia Thompson

Convite

Agora que o fim de semana está aí, convido-os a vir até á Ilha, á Praia do Afrodiziakus, a última, antes do Barracuda.

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É aproveitar que o cacimbo está á porta e, com isso, acabam os banhos.
Ver este pôr do sol.

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Sentados, com isto á frente e, mesmo não devendo, puxar disto, comprado junto num cruzamento da Estrada de Catete, aos miúdos, bem perto da Vila Alice, acendendo-o com isto.

E esquecer, aquecendo a alma e o corpo!

Bom fim de semana a todos!

Encontramo-nos lá.

Divino conteúdo


.. Posted by Hello


fogo fátuo
luz néon
homo-sapiens
eis o que somos

na fatia
de cada dia
cada gomo
um gnomo
se instala
se estala
na festa viva da poesia


Zhô Bertholini
(in Sem Ensaio)

Poesia


.. Posted by Hello

A poesia
é uma família
dispersa
de náufragos
bracejando
no tempo
e no espaço.


Augusto de Campos

Estarrecido!

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É crime interromper o sofrimento atroz a um doente terminal.
É crime uma mulher interromper uma gravidez.
Não é crime a condenação á morte de um ser, por impedimento de uma transfusão sanguínea!

Estranha e irracional sociedade esta!
Será possível??

Agradecimento

Á Brigida pelo seu imenso talento e sensibilidade.
Só isso permite a esta «loja» fazer umas «flores».
Obrigado, amiga, pela companhia e pelas amáveis palavras!

Leituras


.. Posted by Hello

O Incompetente e a Brígida lançaram-me o desafio e, como não sou de «ficar nas covas»…

Não podendo sair do Fahrenheit 451, que livro quererias ser?
Não li Fahrenheit 451, nem vi o filme. Se a questão é ser um livro no mundo infernal de Fahrenheit 451 seria, sem dúvida, Papillon de Henri Charrière, pela coragem que me daria a resistir e a vencer.

Já alguma vez ficaste apanhadinho por um personagem de ficção?
em dúvida, Papillon, Dax (em Os Aventureiros, de Harold Robbins), Richard Bach (em Ponte para a Eternidade e Fernão Capelo Gaivota), Ellie Arroway (em Contacto, de Carl Sagan)… e muitos, muitos outros.

Qual foi o último livro que compraste?
Ventos do Apocalipse de Paulina Chiziane.

Qual foi o último livro que leste?
A Ilha das Trevas, de José Rodrigues dos Santos (muito bom!)

Que livros estás a ler?
Releeio um desconhecido, mas fantástico, livro de Robert Gaillard – Reino da Noite. Seguirei por Equador, de Miguel Sousa Tavares e Anjos e Demónios, do «indexado» Dan Brown.

Que livros (5) levarias para uma ilha deserta?
1. O Principezinho de Antoine de Saint Exupéry.
2. Papillon, de Henri Charrière.
3. Spartacus, de Howard Fast.
4. Antologia Poética com infindáveis poemas onde estivessem representados todos os «sabores» da língua portuguesa.
5. Dicionário Português - Polinésio para me poder entender com as nativas… embora nós, tugas, sejamos bastante desenrascados.
;-)

A quem vais passar este testemunho (três pessoas) e porquê?
Aos meus excepcionais amigos Margem, António e Io, as belíssimas palavras com que nos brindam diariamente enchem-me de curiosidade quanto aos seus mestres.

E os vencedores são?
Os livros, apesar de desmesuradamente caros!

Mulata


.. Posted by Hello


Os teus defeitos são graça
que mais me prendem, querida...
Mistério de duas raças
que se encontram na vida.

E, no mato, em nostalgia,
num exílio carinhoso,
fizeram essa alegria
do teu olhar misterioso.

E deram forma de sonho,
em seu viver magoado,
a essa estilo risonho
do teu corpo bronzeado...

Que é bem e grácil maneira
em que a volúpia se anima,
- bailando duma fogueira
queimando quem se aproxima!

A tua boca dolente,
cicatriz de algum desgosto
é um vermelho poente
no lindo sol do teu rosto.

E os beijos que pronuncias
são palavras dolorosas
Teus beijos são tiranias
são como espinhos de rosas...

Que me embriagam, amantes,
no éter do seu perfume...
Teus beijos são navegantes
sobre as ondas do ciúme.

Os teus defeitos são graças
desse mistério profundo...
Saudade de duas raças
que se abraçaram no mundo!


Tomaz Viera da Cruz

Em torno da minha baía


Baía de Ana Chaves (São Tomé), foto de Brigida Rocha Brito, aqui Posted by Hello


Aqui, na areia,
Sentada à beira do cais da minha baía
do cais simbólico, dos fardos,
das malas e da chuva
caindo em torrente
sobre o cais desmantelado,
caindo em ruínas
eu queria ver à volta de mim,
nesta hora morna do entardecer
no mormaço tropical
desta terra de África
à beira do cais a desfazer-se em ruínas,
abrigados por um toldo movediço
uma legião de cabecinhas pequenas,
à roda de mim,
num voo magistral em torno do mundo
desenhando na areia
a senda de todos os destinos
pintando na grande tela da vida
uma história bela
para os homens de todas as terras
ciciando em coro, canções melodiosas
numa toada universal
num cortejo gigante de humana poesia
na mais bela de todas as lições


Alda do Espírito Santo

Meditemos


.. Posted by Hello

Live as if you were to die tomorrow.  
Learn as if you were to live forever.

Mahatma Gandhi

Subpoesia


Feiticeiro, do Anomalias Posted by Hello


Subsaarianos somos
sujeitos subentendidos
subespécies do submundo

subalimentados somos
surtos de subepidemias
sumariamente submortos

do subdólar somos
subdesenvolvidos assuntos
de um sul subserviente


José Luís Mendonça
(Chuva novembrina)

Lembrei-me deste poema depois de ter lido isto no excelente Pululu.

Hoje apetece-me passear...


Mercado do Benfica, Luanda Posted by Hello

...e esquecer-me no fascínio das cores e das formas da arte africana.
Apetece-me comprar ginguba á quitandeira e ir beber uma Cuca no primeiro bar popular na berma da estrada.
Apetece-me ouvir kimbundu sem perceber uma palavra e estremecer ao ritmo da música angolana em altos berros da aparelhagem...
Apetece-me, em Benfica, por entre arte e uma Cuca, falar de Mantorras e desse outro Benfica, longínquo que poderia, perfeitamente, ter ontem iniciado uma obra prima...
Apetece-me...

O cercado


Entrance to african village, Dan Civa Posted by Hello


De que cor era o meu cinto de missangas, mãe
feito pelas tuas mãos
e fios do teu cabelo
cortado na lua cheia
guardado do cacimbo
no cesto trançado das coisas da avó

Onde está a panela do provérbio, mãe
a das três pernas
e asa partida
que me deste antes das chuvas grandes
no dia do noivado

De que cor era a minha voz, mãe
quando anunciava a manhã junto à cascata
e descia devagarinho pelos dias

Onde está o tempo prometido p'ra viver, mãe
se tudo se guarda e recolhe no tempo da espera
p'ra lá do cercado


Ana Paula Ribeiro Tavares
(Dizes-me coisas amargas como os frutos)