Autocrítica


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Aqui, a sós.
Entre mim e o sonho
De cantar-te,
A voz
De que disponho
Sem engenho e arte...

Fraca e mal nascida,
Nasce,
E nunca digo de nós,
Da vida.
Do Sol
Que prossigo,
Com palavras-não-gastas...
Nasce,
E fica-se (tece)
A tristeza mole da derrota
Pelo mal que digo,
(Canto!)
A certeza da vitória
Nesta rota...

Espanto sem história
Neste esforço
De cantar-te?
Se és tão simples água
Ou sol nas veias,
Simples olhar límpido
De criança perpétua
Sem a primeira mágoa?!

Simples leveza de amar-te,
Simples esperança simples,
Maré-cheia e horizonte,
Escorço de linhas
Com o SOL lá, PÃO e FONTE!...
– ah! minhas palavras minhas!


António Cardoso

Férias....

Amigos, vou pegar na Cacussa, Image Hosted by ImageShack.us arrumar a Image Hosted by ImageShack.us pegar no Image Hosted by ImageShack.us e no Image Hosted by ImageShack.us colocar tudo no Image Hosted by ImageShack.us pôr os Image Hosted by ImageShack.us e ver se apanho um pouco de Image Hosted by ImageShack.us .

Vêm aí 15 dias de férias bem merecidas...
Sim, porque quem diz que o «negócio» que eu e a IO abraçamos é moleza... enganou-se!!
Ainda há pouco o chefão «ameaçou-me» interromper as férias... Como se algo fosse dependente da presença de uma única pessoa!!

Vou andar por aí... Divirtam-se!
Vou tentar descansar o máximo... como primeira medida o «télélé» de serviço ficou sem bateria.... Image Hosted by ImageShack.us
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VVVVIIIIIITTTÓÓÓÓÓÓRRRRRIIIIIAAAAA


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Justíssima!
A vitória do Vitória!
O Benfica literalmente passeou as camisolas...
Sem pulmão, sem garra e, viu-se desde o primeiro minuto, á procura apenas do golpe de sorte!
Este foi o «pão-nosso-de-cada-dia» nesta época em que só as surpreendentes «invenções nortenhas» e o «hara-kiri» natalício do Sporting (Natal pode ser em Maio ou quando um homem quiser...), permitiu ao Benfica ganhar alguma coisa esta época.
Tanta sorte junta não voltará a repetir-se!

Viva o Vitória!!

Filho


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Nicolau, menino, entra,
Onde estiveste, Nicolau,
que trazes a arrastar
o teu brinquedo morto?

Nicolau, menino, entra.
Vem dizer-me onde foi que tu estiveste
e a estrela fugiu das tuas mãos.

Tens comigo o teu catre de lona velha.
Deita-te, Nicolau, o fantasma ficou lá longe.

Dorme sem medo.
Porão, roça, medos imediatos,
tudo ficou lá longe.

Quando acordares a jornada será mais longa.

Nicolau, menino,
onde foi que deixaste
o corpo que te conheci?
Deus há-de querer que o sono te venha depressa
no meu catre.


Oswaldo Alcântara

No mundo das crianças


A minha Ana Cristina navegando no mundo de sonhos Posted by Hello



Riso contagiante,
Correria sem destino,
Pássaro ao vento,
Experiência de voo,
Dúvida e êxtase,
Felicidade!

E também

Meninos sem pais,
Choro de desespero e
Gritos de coragem.
Exploração vil,
Abandono criminoso e
Medo!



Sonho palpável,
Esperança sem limite,
Horizonte de saber,
Sangue em fúria,
Vontade de mudança,
Irreverência!

E também

Meninos com armas,
Livros sem meninos.
Brinquedos abandonados,
Ilusões desfeitas.
Vastas barrigas cheias
De fome!


Um dia as crianças tomarão nas suas mãos
o mundo que é deles,
que nós lhes tomámos por empréstimo.

Será esse o início de um mundo novo
Que não soubemos, de todo, construir!

Eu, quando for grande,
quero continuar a ser criança
para que o sonho não morra!



Cacusso
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BENFIIIIIIIIIIIIIIIICCCAAAAAAAAAA


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Honra ao novo campeão!!
Sofrido mas merecido!

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O golo mais festejado do dia de hoje!
A equipa que no dia de hoje deixou os tremeliques em casa e jogou á bola!!
Honra á Briosa!

Guedes e Ratzinger


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Escolhas do Espírito Santo, do confrade Jumento, com a devida vénia.
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Paisagem


Foto de António Ferreira de Sousa em Caminhadas e Descobertas em STP Posted by Hello


Entardecer... capim nas costas
do negro reluzente
a caminho do terreiro.
Papagaios cinzentos
explodem na crista das palmeiras
e entrecruzam-se no sonho da minha infância
na porcelana azulada das ostras.
Alto sonho, alto
como o coqueiro na borda do mar
com os seus frutos dourados e duros
como pedras oclusas
oscilando no ventre do tornado,
sulcando o céu com o seu penacho
doido.
No céu perpassa a angustia austera
da revolta
com suas garras suas ânsias suas certezas.
E uma figura de linhas agrestes
se apodera do tempo e da palavra.


Maria Manuela Margarido

Reflexões temporais


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A escuridão reinava,
densa e impenetrável.
Continha em si a força destruidora,
a explosão, a energia criadora e a luz.

Emergiu o reino do tempo.

Ao momento de trevas, de ordem,
de unificação sucedeu o caos,
a luz, a necessidade de complemento,
a criação... e o tempo.

Tempo, luz, criação, complemento...quanto mais, melhor!

Que venha o tempo e levante questões...
Que traga sofrimento e dúvida...
Que venha o tempo e a luz...
Partilhemos a luz,
saberemos então o valor do amor!

Perder-se-á o tempo se dele não se fizer luz.
O tempo é o momento, a luz...
As matizes caleidoscópicas da luz
são a memória do tempo,
do meu tempo.



Cacusso


"Fala-me de tempo, Poeta.
Do teu tempo..."

"Nos tempos em que o tempo é só instante
Tão intenso e penetrante
Que o poderia chamar, por maldade
De pura felicidade."


Agradeço á Margens e ao António San a inspiração :-) :-P
destes pensamentos.
Fantásticas e luminosas, porque intemporais, são as suas palavras.

Obrigado!
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Quissange - Saudade Negra


Tocador de quissange Posted by Hello


Não sei, por estas noites tropicais,
o que me encanta...
Se é o luar que canta
ou a floresta aos ais.

Não sei, não sei, aqui neste sertão
de musica dolorosa
qual é a voz que chora
e chega ao coração...

Qual o som que aflora
dos lábios da noite misteriosa!

Sei apenas, e isso é que importa,
que a tua voz, dolente e quase morta,
já mal a escuto, por andar ausente,
já mal escuto a tua voz dolente...

Dolente, a tua voz "luena",
lá do distante Moxico,
que disponho e crucifico
nesta amargura morena...

Que é o destino selvagem
duma canção em que tange,
por entre a floresta virgem
o meu saudoso "Quissange".

Quissange, fatalidade
deste meu triste destino...
Quissange, negra saudade
do teu olhar diamantino.

Quissange, lira gentia,
cantando o sol e o luar,
e chorando a nostalgia
do sertão, por sobre o mar.

Indo mares fora, mares bravos,
em noite primaveril
acompanhando os escravos
que morreram no Brasil.

Não sei, não sei,
neste verão infinito,
a razão de tanto grito...

-Se és tu, oh morte, morrei!

Mas deixa a vida que tange,
exaltando as amarguras,
e as mais tristes desventuras
do meu amado Quissange!


Tomaz Vieira da Cruz

Promessa de amor


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Construirei para ti uma casa terrestre,
feita de pão e luz e música,
onde caibas apenas tu
e não haja espaço para os intrusos

E quando, à noite nos amarmos,
como se amaram
o primeiro homem e a primeira mulher,
mandarei que repiquem os tambores

- para que saibam todos que voltaram ao mundo
o primeiro homem e a primeira mulher.


João Melo

São meus estes rios


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São meus estes rios
que buscam caminho
rastejando entre luar e silêncio,
sombra e madrugada,
até ao seu fim marítimo.

A minha alma está neles,
líquida e sonora
como a água entre o quissange das pedras,
o anoitecer nas fontes.

Tenho rios vermelhos e quentes
na minha dimensão física,
rios remotos, remotos como eu.


Manuel Lima

O meu poema


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O meu poema sou eu-branco
Montado em mim-preto
A cavalgar pela vida


Mário Pinto de Andrade

Profissão: Mãe


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Helena foi renovar a sua carta de condução.
Pediram-lhe para informar qual era a sua Profissão.
Ela hesitou, sem saber bem como se classificar.
- O que eu pergunto é se tem um trabalho, - insistiu o funcionário.
- Claro que tenho um trabalho, - exclamou Helena.
- Sou mãe.
- Nós não consideramos 'Mãe' um trabalho. Vou colocar 'dona de casa', disse o funcionário friamente.

Não voltei a lembrar-me desta história até ao dia em que me encontrei em situação idêntica...
A pessoa que me atendeu era obviamente uma funcionária de carreira, segura, eficiente, dona de um título sonante.

- Qual é a sua ocupação? - perguntou.

Não sei o que me fez dizer isto; as palavras simplesmente saltaram-me da boca para fora:

- Sou Doutora em Desenvolvimento Infantil e em Relações Humanas. A funcionária fez uma pausa, a caneta de tinta permanente a apontar para o ar e olhou-me como quem diz que não ouviu bem... Eu repeti pausadamente, enfatizando as palavras mais significativas.
Então reparei, maravilhada, como ela ia escrevendo, com tinta preta, no questionário oficial.
- Posso perguntar, - disse-me ela com novo interesse, - o que faz exactamente?

Calmamente, sem qualquer traço de agitação na voz, ouvi-me responder:

- Desenvolvo um programa a longo prazo (qualquer mãe faz isso), em laboratório e no campo (normalmente eu teria dito dentro e fora de casa). Sou responsável por uma equipa (a minha família) e já recebi dois projectos (menino e menina). Trabalho em regime de dedicação exclusiva (alguma mulher discorda???), o grau de exigência é ao nível das 14 horas por dia (para não dizer 24 horas).

Houve um crescente tom de respeito na voz da funcionária que acabou de preencher o formulário, se levantou e pessoalmente foi abrir-me a porta. Quando cheguei a casa, com o título da minha carreira erguido, fui recebida pela minha equipa: - um com 10 anos, outra com 8.

Senti-me triunfante. Maternidade... que carreira gloriosa!

Assim, as avós deviam ser chamadas "Doutora-Sénior em Desenvolvimento Infantil e em Relações Humanas".
As bisavós: "Doutora- Executiva- Sénior".
E as tias: "Doutora - Assistente".

"Somos do tamanho dos nossos sonhos."

(por email)


Não foste renovar a carta, nem sequer sabias ler ou escrever. Porém instrução e educação não são sinónimos, por isso, foste competentíssima Doutora em Desenvolvimento Infantil e Relações Humanas.

Obrigado, Doutora!

Dizia o email que « Mande isto às mães, avós, bisavós e tias que conheça. Uma homenagem carinhosa a todas as mulheres, mães, esposas, amigas e companheiras. Doutoras na Arte de fazer a vida melhor!!».

Infelizmente, não o receberás... mas, projecto de ti, estou aqui, em nome da tua equipa a lembrar-te.

Obrigado, Mãe!
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Ame-a!


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Diz um conto chinês que um jovem foi visitar um sábio conselheiro e
disse-lhe sobre as dúvidas que tinha a respeito de seus sentimentos por uma
bela moça.
O sábio escutou-o, olhou-o nos olhos e disse-lhe apenas uma coisa:
-Ame-a.
E logo se calou.
Disse o rapaz:
-Mas, ainda tenho dúvidas...
-Ame-a, disse-lhe novamente o sábio.
E, diante do desconserto do jovem, depois de um breve silêncio,
disse-lhe o seguinte:
-Meu filho,
Amar é uma decisão, não um sentimento.
Amar é dedicação e entrega.
Amar é um verbo e o fruto dessa acção é o amor.
O amor é um exercício de jardinagem.
Arranque o que faz mal, prepare o terreno, semeie, seja paciente,
regue e cuide.
Esteja preparado porque haverá pragas, secas ou excessos de chuvas,
mas nem por isso abandone o seu jardim.
Ame, ou seja, aceite, valorize, respeite, dê afecto, ternura, admire
e compreenda.
Simplesmente:

-Ame!!!

Porque:
A inteligência sem amor te faz perverso.
A justiça sem amor te faz implacável.
A diplomacia sem amor te faz hipócrita.
O êxito sem amor te faz arrogante.
A riqueza sem amor te faz avarento.
A docilidade sem amor te faz servil.
A pobreza sem amor te faz orgulhoso.
A beleza sem amor te faz ridículo.
A autoridade sem amor te faz tirano.
O trabalho sem amor te faz escravo.
A simplicidade sem amor te deprecia.
A lei sem amor te escraviza.

(por email)
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Prelúdio


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Pela estrada desce a noite...
Mãe-Negra, desce com ela...

Nem buganvilias vermelhas,
nem vestidinhos de folhos,
nem brincadeiras de guisos,
nas suas mãos apertadas.

Só duas lágrimas grossas,
em duas faces cansadas.

Mãe-Negra tem voz de vento,
voz de silêncio batendo
nas folhas do cajueiro...

Tem voz de noite, descendo,
de mansinho, pela estrada...

Que é feito desses meninos
que gostava de embalar?...

Que é feito desses meninos
que ela ajudou a criar?...
Quem ouve agora as histórias
que costumava contar?...

Mãe-Negra não sabe nada...

Mas aí de quem sabe tudo,
como eu sei tudo
Mãe-Negra!

Os teus meninos cresceram,
e esqueceram as histórias
que customavas contar...

Muitos partiram p'ra longe,
quem sabe se hão-de voltar!...

Só tu ficaste esperando,
mãos cruzadas no regaço,
bem quieta, bem calada.

É tua a voz deste vento,
desta saudade descendo,
de mansinho pela estrada...


Alda Lara


Jardins Proibidos




Quando amanheces,logo no ar,
Se agita a luz sem querer,
E mesmo dia,vem devagar,
Para te ver.

E já rendido,vê-te chegar,
Desse outro mundo só teu,
Onde eu queria, entrar um dia,
Pra´ me perder.
P´ra me perder, nesses recantos
Onde tu andas, sozinha sem mim,
Ardo em ciùme desse jardim,
Onde só vai quem tu quiseres,
Onde és senhora do tempo sem fim,
Por minha cruz, jóia de luz,
Entre as mulheres.

Quebra-se o tempo, em teu olhar,
Nesse gesto sem pudor,
Rasga-se o céu, e lá vou eu,
P´ra me perder.

P´ra me perder, nesses recantos
Onde tu andas sozinha sem mim,
Ardo em cíume desse jardim
Onde só vai quem tu quiseres
Onde és senhora do tempo sem fim,
Por minha cruz, Jóia de luz
Entre as mulheres...


Paulo Gonzo

Vem, cacimbo


.. Posted by Hello

Estende teus dedos anelados sobre a minha carapinha
derrama a tua inconsciente tranquilidade
sobre a minha angústia submergida.

Vem, cacimbo
eu quero ver os cafeeiros ao peso dos bagos vermelhos
endireita os troncos vencidos dos bambus
coroa os cumes altos das serras do Bailundo
limpa a visão empoeirada dos comboios que descem para Benguela
nimba poeticamente os horizontes dos camionistas de Angola.

Vem, cacimbo
debruça-te cuidadosamente sobre as plantas da madrugada,
destrói a angústia resignada das gentes da minha terra
abre-lhes os horizontes dos cantos de esperança.

Vem, cacimbo
Derrama a tua inquieta saciedade sobre a minha natureza
a esta hora empoeirada com o barulho das esquinas
com o cheiro a óleo sujo dos automóveis
e com a visão daquele nosso amigo
cujo ordenado são quinze escudos diários
irremediavelmente caido sobre a grama do jardim

O cacimbo
eu quero percorrer teus campos sossegados
orquestrados pela alegria do beija-flor.


Henrique Guerra

Avós


Zé e Alexandrina, do Vale de Asna. Posted by Hello

Em foto publicada pelo Correio da Manhã na edição de 21-3-82 e que ilustrava o sétimo artigo sobre a Regionalização - Como ligar o poder central às Regiões Administrativas.

Saudade.
Honra á sua memória.

Férias... há 40 e tantos anos

Chega a altura de férias…
Sinto, muitos dias antes da partida, a agitação da minha mãe na preparação de tudo quanto era necessário durante o mês que iríamos estar longe…
Vejo nitidamente a agitação e sinto a saudade no seu olhar.
Relembro a exagerada quantidade de coisas que preparava e os risos que isso provocava.
O dia da partida!
O primo Querubim chegou, vagarosamente, pelas ruas térreas e escavacadas da Brandoa, no seu sumptuoso DKW.
Viagem inicial apenas com as luzes do automóvel e a entrada na cidade…
Depois a passagem na Praça de Espanha com todas aquelas luzes, a entrada num mundo diferente…
Recordo, extasiado, as luzes de Lisboa como se tivesse sido transportado para um outro mundo.

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Chegada a Santa Apolónia agitada e fervilhante de actividade…
A entrada no comboio-correio, á meia-noite, completamente apinhado de gente…
A viagem a pé, quase sempre, sentando-me sobre as malas, episodicamente, por troca com a minha irmã.
A paragem em todas as estações e apeadeiros…
Anos depois, pelas várias experiências pessoais e pelo «ensino», saberia sem dificuldade o nome de todas as estações…
Chegada de manhã a Coimbra e a mudança de comboio…na altura em que o comboio para a Lousã passava pelo meio da cidade…

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Manhã alta… cada vez mais perto.
Sabia estar cada vez mais perto… O lento andamento do comboio permitia-me ver que boa parte das pedras entre os carris eram lisas como as que cobriam os caminhos das serranias para onde ia.
Lousã…e nova mudança de transporte.
Desta vez para um autocarro antiquíssimo…

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Bagagens sobre o tejadilho e aí vamos nós curva após curva em direcção a Arganil.
Pelo caminho ficara já parte do farnel que a minha mãe tinha religiosamente preparado e viajava num cesto de vime.
Góis… a ponte romana sobre o Rio Ceira.
A emoção cresce.
Uns quilómetros á frente sabemos estar quase a família toda á espera…
O autocarro gingão bamboleia-se numa curva, á direita vê-se a povoação de Sequeiros… é a seguir.
O meu pai chama a atenção do cobrador que sairemos na paragem seguinte – Sarnôa, junto á Capela da Senhora da Boa Viagem.
Á saída de nova curva….uma pequena recta, dentro do autocarro os sorrisos rasgam-se…lá fora ao longe, entre as mimosas e os pinheiros, vêm-se braços no ar de alegria.
Cumprimentos, abraços, beijos, risos e lágrimas de felicidade pelo reencontro enquanto a bagagem escorrega por uma corda junto ás janelas do autocarro.
Arrumar a bagagem na mula que o meu avô traz.
Foto de recordação e início da última parte da viagem, já a meio da tarde, que nos levará dali até á aldeia de Vale de Asna.

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Por cada aldeia que se passa o mesmo ritual… os abraços, os beijos, a alegria…e os sucessivos e irrecusáveis convites para petiscar qualquer coisa e molhar a garganta.
O alcatrão ficou para trás… terra batida agora até ao fim, sempre a subir.
Estrada só até Linhares, daí por diante será a subida de Martim Pires que nos deixará na fronteira entre Góis e Arganil.
Volta-se a encontrar estrada florestal na Celada das Eiras onde se disfruta de uma paisagem deslumbrante… e onde é obrigatório parar, para petiscarmos todos e recuperar do esforço dispendido na íngreme subida e para, depois do repasto e de mais dois dedos de conversa, começarmos a separação para as várias aldeias… até aos dias seguintes, nos trabalhos do campo, nas convívios familiares ou nas Festas de Santa Catarina ou do Senhor da Amargura.
Finalmente a chegada!

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Retrato de vinte e quatro horas de viagem num país cinzento e tristonho, a meio do ultimo quartel do século vinte, onde se passava de um bairro clandestino para a civilização e daí para um isolamento quase absoluto e um modo de vida quase feudal.

Mas, mesmo assim, com que emoção recordo estes passos…

Que saudade!!

Primeiro amor. Vivi aí.

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Imagem pedida «emprestada» à Maria

Primeiro amor. Vivi aí.
Casa grande de janelas abertas
para o verde, chave do nosso coração.
Meninos do bom Deus com histórias diferentes
e o mesmo temor e segurança.
Tudo tinha muita cor
como as casas pintadas de fresco
e as ruas debaixo da sombra das árvores.
Dos jardins víamos os novos modelos dos carros
dos anos setenta.
Havia concertos para piano sem orquestra.
E, às vezes, mulheres, loiras muito loiras
cantavam músicas de nós desconhecidas.

Posávamos para os fotógrafos
moças virgens esperadas à saída das aulas
e ouvíamos "if you are going to San Francisco".
As fotografias dessa época estão em casa das tias
e os nossos olhos de terra ou de água ou de noite
não são o que eram: por isso, continuam os mesmos.

Ondulam as cortinas levemente
como a última brisa
para lá da sebe junto aos muros baixos
oiço o barulho das árvores
imensas e antigas
e lembra-me um andamento
das Fantasias de Schumann.
Primeira amor. Vivi aí.

Maria Alexandre Dáskalos

Ouvir aqui

O grande desafio

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Naquele tempo
A gente punha despreocupadamente os livros no chão
ali mesmo naquele largo - areal batidos dos caminhos passados
os mesmos trilhos de escravidões
onde hoje passa a avenida luminosamente grande
e com uma bola de meia
bem forrada de rede
bem dura de borracha roubada às borracheiras do Neves
em alegre folguedo, entremeando caçambulas... a gente fazia um desafio...
O Antoninho
filho desse senhor Moreira da taberna
Era o capitão
E nos chamava de ó pá,
Agora virou doutor(cajinjeiro como nos tempos antigos)
passa, passa que nem cumprimenta- doutor não conhece preto da escola.
O Zeca guarda-redes
(pópilas, era cada mergulho!Aí rapage - gritava em delírio a garotada)
Hoje joga num clube da Baixa
Já foi a Moçambique e no Congo
Dizem que ele vai ir em Lisboa
Já não vem no Musseque
Esqueceu mesmo a tia Chiminha que lhe criou de pequenino
nunca mais voltou nos bailes de Don´Ana, nunca mais
Vai no Sportingue, no Restauração
outras vezes no choupal
que tem quitatas brancas
Mas eu lembro sempre o Zeca pequenino
O nosso saudoso guarda-redes!
Tinha também
tinha também o Velhinho, o Mascote, O Kamauindo...
- Coitado do Kamauindo!
Anda lá na casa da Reclusão
(desesperado deu com duas chapadas na cara
do senhor chefe
naquele dia em que lhe prendeu e lhe disparatou a mãe);
- O Velhinho vive com a Ingrata
drama de todos os dias
A Ingrata vai nos brancos receber dinheiro
E traz pro Velhinho beber;
- E o Mascote? Que é feito do Mascote?- Ouvi dizer que foi lá em S. Tomé como contratado.
É verdade, e o Zé?
Que é feito, que é feito?
Aquele rapaz tinha cada finta!
Hum... deixa só!
Quando ele pegava com a bola ninguém lhe agarrava
vertiginosamente até na baliza.
E o Venâncio? O meio-homem pequenino
que roubava mangas e os lápis nas carteiras?
Fraquito da fome constante
quando apanhava um pinhão chorava logo!
Agora parece que anda lixado
Lixado com doença no peito.
Nunca mais! Nunca mais!
Tempo da minha descuidada meninice, nunca mais!...
Era bom aquele tempo
era boa a vida a fugir da escola a trepar aos cajueiros
a roubar os doceiros e as quitandeiras
às caçambulas:
Atresa! Ninguém! Ninguém!
tinha sabor emocionante de aventura
as fugas aos polícias
às velhas dos quintais que pulávamos
Vamos fazer escolha, vamos fazer escolha... e a gente fazia um desafio...
Oh, como eu gostava!
Eu gostava qualquer dia
de voltar a fazer medição com o Zeca
o guarda-redes da Baixa que não conhece mais a gente
escolhia o Velhinho, o Mascote, o Kamauindo, o Zé
o Venâncio, e o António até
e íamos fazer um desafio como antigamente!
Ah, como eu gostava...
Mas talvez um dia
quando as buganvílias alegremente florirem
quando as bimbas entoarem hinos de madrugada nos capinzais
quando a sombra das mulembeiras for mais boa
quando todos os que isoladamente padecemos
nos encontrarmos iguais como antigamente
talvez a gente ponha
as dores, as humilhações , os medos
desesperadamente no chão
no largo - areal batido de caminhos passadosos mesmos trilhos de escravidões
onde passa a avenida que ao sol ardente alcatroamos
e unidos nas ânsia, nas aventuras, nas esperanças
vamos então fazer um grande desafio...

António Jacinto

Á memória de Jorge Perestrelo (1948-2005)