136 anos depois da Abolição da Escravatura em Portugal
quarta-feira, fevereiro 23, 2005
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As palavras de António Jacinto e a voz de Rui Mingas, num dia que deve ser sempre recordado porque a escravatura não acabou, modernizou-se e adquiriu formas mais sofisticadas.
MONANGABÉ
Naquela roça grande não tem chuva
é o suor do meu rosto que rega as plantações;
Naquela roça grande tem café maduro
e aquele vermelho-cereja
são gotas do meu sangue feitas seiva.
O café vai ser torrado
pisado, torturado,
vai ficar negro, negro da cor do contratado.
Negro da cor do contratado!
Perguntem as aves que cantam,
aos regatos de alegre serpentear
e ao vento forte do sertão:
Quem se levanta cedo? quem vai a tonga?
Quem traz pela estrada longa
a tipóia ou o cacho de dendém?
Quem capina e em paga recebe desdém
fuba podre, peixe podre,
panos ruins, cinquenta angolares
"porrada se refilares"?
Quem?
Quem faz o milho crescer
e os laranjais florescer
- Quem?
Quem dá dinheiro para o patrão comprar
maquinas, carros, senhoras
e cabeças de pretos para os motores?
Quem faz o branco prosperar,
ter barriga grande - ter dinheiro?
- Quem?
E as aves que cantam,
os regatos de alegre serpentear
e o vento forte do sertão
responderão:
- "Monangambééé..."
Ah! Deixem-me ao menos subir ás palmeiras
Deixem-me beber maruvo, maruvo
e esquecer diluído nas minhas bebedeiras
- "Monangambéé...'"
António Jacinto
(Poemas, 1961)
Rui Mingas
Monangambé