Declaração




















As aves, como voam livremente
num voar de desafio!
Eu te escrevo, meu amor,
num escrever de libertação.

Tantas, tantas coisas comigo
adentro do coração
que só escrevendo as liberto
destas grades sem limitação.
Que não se frustre o sentimento
de o guardar em segredo
como liones, correm as águas do rio!
corram límpidos amores sem medo.

Ei-lo que to apresento
puro e simples – o amor
que vive e cresce ao momento
em que fecunda cada flor.

O meu escrever-te é
realização de cada instante
germine a semente, e rompa o fruto
da Mãe-Terra fertilizante.



Agostinho Neto

o paraíso nós o perdemos em busca do corpo























Foto de "Angola em fotos"





Dos teus medos desliza a serpente nativa
esta se ausenta dos nossos murmúrios
e o seu rasto cega-nos.

Nesse pasto cheguei depois de ti
e já o mundo perdido, amava.
Canções do corpo suspiravam
de atentos tambores urdidos no esquecimento.

Os frutos insaciáveis repartidos em nós
e o hino húmido de palavras que nos excitam
são palavras desafortunadas,
comemo-las e fenecemos.

O paraíso era apenas uma ideia
que ainda nos deixa de bocas aguadas.
Por agora busque-me, contigo moverei
a serpente nativa.



João Tala

Dez grãozinho di terra





















Es dez grãozinho di terra
Qui Deus espadjá na mei di mar
És é di nós és cá tomado na guerra
É Cabo Verde terra querida

Oh Cabo Verde terra 'stimada
Terra di paz terra di gozo
Tude quem djobel na sê regoge
El ca ta bai, el crè ficá
E s'el mandado el ta tchorá

Tchorá sodadi di bôs morenas
Quês ta levá na pensamento
Tchorá recordaçons eternas
Di tempo qui ca tinha sofrimento

Ma mi'm tem fé na Noss Senhor
M'ês vida c'a bai sempre assim
M'el ta libiano di tudo nôs dor
Pês sofrimento podê tem fim



Jotamont

Obama e um acto de cultura universal





















Por Manuel Rui, gentilmente enviado pelo amigo Aires Bustorff





Eu sempre me confundi na realidade com a utopia. Ou na insatisfação constante como forma quase de fingir felicidade na busca, na procura e imitação de coisas muito simples como o voar dos pássaros, o declinar do sol, o brilho das estrelas e o mistério das conchas que aconteciam com os meus pés à beira mar na areia. Sempre não me conseguindo encontrar com o paraíso do infinitamente bom e infinitamente belo para todos, quase desinfinitando a morte que é o único lugar infinito mas parte da vida, o infinitamente belo que até poderia ser um contraste com o infinitamente bom que sempre para mim ficaram sem ser, iguais à inexistência ou à infelicidade de não procurar mais nada, muito antes da nostalgia ou depois da saudade da morte.

Afinal viver é também não imaginar aquilo que pode acontecer enquanto estamos vivos. Só que eu nunca pensei que em vida, para além de tanta coisa que estava, ainda que muito longe, mas no horizonte por detrás da noite e da nuvem, pudesse ainda ter vivido sonhos, porque a minha geração viveu sonhos depois de os ter sonhado no passa-palavra de muitos silêncios. E também viveu a morte de muita alegria triste.

Mas agora era demais. Numa data e hora em que um grande amigo meu fazia anos. Quatro de Novembro. Eu a telefonar-lhe e ele quase ou mesmo esquecido do seu aniversário por causa de OBAMA.

Era algo que nos tocava e falámos ao telefone. Porque era uma coisa que estava impensada no nosso tempo. A utopia tinha ultrapassado a nossa imaginação. Já não era tanto uma eleição ou uma vitória. Fazia semanas que vivíamos a novidade. Principalmente porque OBAMA falara mais ou menos que se mudarmos a sala podemos mudar a casa; e se mudarmos a casa podemos mudar a rua; e se mudarmos a rua podemos mudar a cidade; e se mudarmos a cidade podemos mudar o estado; e se mudarmos o estado podemos mudar o país; e se mudarmos o país podemos mudar o mundo.

OBAMA, em gesto de sagrado, no discurso de Filadélfia, tirou o pé do tiro do reverendo Jeremiah Wright. Embora o reverendo tivesse razão mas era uma razão da memória e da injustiça. Uma razão sobre os que haviam sido negados como pessoas, deixando suor e sangue nas plantações de tabaco e açúcar. Uma razão que podia ser entendida como rancor.

Nesse discurso, OBAMA trouxe uma utopia ligando a jovem Ashley e um mais velho que estava ali por Ashley estar.

No dia e hora em que escrevo este texto ainda não sei se OBAMA ganhou. Mas não é tanto por isso que estou a escrever. É mais por causa do outro que nunca percebeu que eu existo e ele só pode ser também se deixar de estar assim para podermos ser todos.

OBAMA tem um significado do maior acto de cultura universal do início deste século. No século passado, quem tinha televisão ficou uma noite inteira à espera que um homem pisasse a lua.

Neste princípio de século, OBAMA conseguiu criar uma energia, um astral de muitas mãos inteiras pelo pensamento de pessoas de todas as partes do mundo, numa corrente parecida com uma constelação de paz sem fronteriras. E Isso é um acto de cultura que vai ficar.

Não importa que este Messias traga milagres. Importa é o milagre cultural de pôr uma boa parte do mundo inteiro a olhar para ele como um salvador e perder uma noite só a olhar para um televisor como se OBAMA fosse uma madrugada.

No século passado, foram à lua. Agora OBAMA parece que desceu da lua e chegou à terra.

No século passado foi Mandela.

Mas antes de Mandela, o reverendo Luter King já tinha orado que tinha um sonho. O reverendo foi assassinado por causa do sonho.

Mandela tornou realidade um bocado do sonho do reverendo. Por cima de tanta memória que sobrou para os blues.

OBAMA acrescenta mais um bocado de realidade ao sonho do reverendo.

Como Agostinho Neto deixou escrito:

E DO DRAMA INTENSO
DUMA VIDA IMENSA E ÚTIL
RESULTOU CERTEZA

AS MINHAS MÃOS COLOCARAM PEDRAS
NOS ALICERCES DO MUNDO
MEREÇO O MEU PEDAÇO DE PÃO.







Manuel Rui

Alma Negra



















Foto de Denis Farrell, aqui






Diz-se que o homem negro não tem alma,
ou antes que tem alma tão bisonha,
tão grosseira, tão vil... – Há quem suponha
que o negro só se exalta, e não se acalma:

que só conhece o vício, e não a palma,
a crença bruta, e não a fé risonha;
em suma, que não ama, que não sonha,
com paz divina, com divina calma.

Há quem apenas veja, meramente,
que a África é o sol do meio-dia,
– terra queimada pelo sol ardente.

Há quem não saiba ver ou avaliar
toda a celeste e lírica poesia
duma noite africana de luar...



Geraldo Bessa Victor

Admiração é...
























Capa do jornal "Record" de hoje





Brasil, 6 - Portugal, 2
A imprensa portuguesa fala, quase em uníssono, em humilhação...

Humilhação???

Humilhação é ter uma equipa claramente superior, superiormente orientada e com jogadores de superior categoria e, nessas condições, perder clamorosamente 6-2!!!

Foi isso que aconteceu??? Não, com toda a clareza!
Não houve qualquer humilhação.

O Brasil é claramente superior... O Brasil foi claramente superior em todos os capítulos de jogo!
Onde está a admiração??

Admiração é... termos conseguido ganhar em Malta!
Admiração é... caber na cabeça de alguém que uma equipa em claro declínio tenha colocado como hipótese, ainda que meramente académica, estar ao mesmo nível do Brasil!!
Admiração é... alguém acreditar em Queirós quando afirma que a equipa se deslumbrou com um golo aos 4 minutos. Completamente estapafúrdia esta ideia!!
Admiração é... que alguém penssasse que, pelo facto de Scolari ter tido 1 empate e 2 vitórias contra o Brasil, ganhar era um dado adquirido e o Brasil tinha passado ad aeternum á condição de nosso "cliente"... Santa ingenuidade!
Admiração é... que alguém tenha pensado que o jogo serviria apenas para que Káka passasse sem luta a "coroa" a Cristiano Ronaldo e o Brasil se vergasse á superioridade que, para Portugal, isso representaria. Claríssimo engano!!! Se o jogo se resumisse a isso, Ronaldo teria perdido talvez não 6-2 com Káka mas aí uns... 10-0!!!!
Admiração é... ninguém perceber que para Ronaldo brilhar precisa de ter uma equipa com ele. No United é 10+Ronaldo, aqui pretende-se que seja Ronaldo+10!!! Idiotice!
Admiração é... que apenas agora se tenha percebido não ser possível haver um treinador campeão do mundo sem perceber nada do que faz.
Admiração é... que o patrão de Queirós tenha voltado a permitir jogos de bastidores, de influência dos clubes,tenha voltado a optar pelo poder dos empresários ou pelo poder que os media tem em fazer e desfazer equipas...
Admiração é... ninguém entender que faz falta no balneário para defesa dos jogadores, para implementação de um modelo, de modo a conseguirem-se atingir os objectivos, de alguém que mande efectivamente. Mesmo que seja desagradável, casmurro e apelidado de sargentão. Ao que sei a diplomacia tem lugar no Palácio das Necessidades e não em qualquer campo de futebol.

O que custou ver no Brasil/Portugal foi o "baile" - o mesmíssimo tipo de "baile" que o FC Porto dançou no Emirate Stadium.
Num e noutro foi confragedor e chegou a dar pena... e aí estou de acordo com Queirós.
Deu pena!
Não pode é, com todo o peso que isso tem, deixar de assumir as r-e-s-p-o-n-s-a-b-i-l-i-d-a-d-e-s.
Não sou eu que ganho palettes de dinheiro para treinar e orientar a equipa. É ele!

Em qualquer clube, Queirós não chegaria ao Natal.
Aqui vai chegar.
Os media dar-lhe-ão o apoio... porque precisam dele. No dia em que ele, farto de palpites, lhes virar as costas... será crucificado por menos que estes 6-2 e, provavelmente, por qualquer fait-divers sem qualquer importância.

Por este andar voltaremos a estar na fase final do Mundial Ibérico (2018) provavelmente sob a batuta de um velho astuto e vivido de nome... Luiz Felipe Scolari.

Último poema

























Sair do temporal
é ganhar tempo pra coser as velas
é ganhar tempo pra fazer aguada
e aparelhar.
O meu destino certo e tão inquieto
é o destino trémulo e concreto
duma agulha de marear.

Ah, não esperem que eu não espere,
nem acreditem que eu tema
ou que eu possa naufragar…
Numa vela renovada
há insistência pra conter o vento,
há arrogância pra conter o mundo,
há energia pra domar o tempo
e força pra singrar.

Sair do temporal
é ter a nostalgia do combate
que vai recomeçar.

Tomei o gosto às horas de calema
e sou irmão do mar.




Cochat Osório

Meditemos...
























Um velho índio descreveu certa vez os seus conflitos internos.

"Dentro de mim existem dois cachorros, um deles é cruel e mau, o outro é muito bom e dócil. Eles estão sempre a brigar".

Quando lhe perguntaram qual dos cachorros ganharia a briga, o sábio índio parou, reflectiu e respondeu:

"Aquele que eu alimentar"

A Casa

























A pedra, o pau, o barro,
Os alicerces
Da casa prometida
Sabida
Como certa.

A pedra dura
Madeira que se dobra
O barro que se molda
Coragem que perfura
A timidez que sobra
Paciência que se amolda.

Um bocado de sonho em cada mão,
Um resto de azul
No resto da manhã,
E amanhã,
De manhã cedo,
Sem medo,
A casa que te ofereço
Cercada de amizade.


Aires de Almeida Santos

Jerónimo Sousa que se cuide!...
























«Eu não acredito em reformas quando se está em democracia, quando não se está em democracia, é outra conversa, eu digo como é que é e faz-se; e até não sei, se a certa altura, não é bom haver seis meses sem democracia, mete-se tudo na ordem e depois então, venha a democracia»



Manuela Ferreira Leite
Lisboa, 18/11/2008




Séria candidata a Secretária-Geral do PCP.

Será que os "setôres" conseguem, por isto, juntar 140.000 para protestar contra esta barbaridade?



"Este país é um colosso! Está tudo grosso!"
(Ivone Silva e Camilo de Oliveira)


Posse























Foto de Quark, aqui




Deitei-me sobre o teu cansaço,
na esperança de trazer-te o descanso
que há tanto tempo em vão procuras.

Cobri teu corpo
e tive-te, e perdi-te ao alvorecer,
quando tudo se confunde
e a noite é dia, e o dia é noite,
e as estrelas são o instrumento
dos nossos sonhos e dos nossos êxtases.

Encontrei-te depois,
quando te perdeste e me encontraste também,
e já o dia amanhecia outra vez…



Anny Pereira

Até que enfim!!!





















Até que enfim!...

Há muito que se tornava visível a qualquer cego que as “claques” dos clubes de futebol nada mais são que um alfobre de vândalos, universidade de fanatismo e de intolerância.
Tudo o que é excessivo é doentio!
Tudo o que é excessivo acabará por conduzir a situações irracionais.

Espero que, a exemplo do que sucedeu aos “No Name Boys”, o mesmo suceda noutras latitudes e longitudes.
Atitudes e bibliografia publicada são já, se se quiser, motivo para actuação.

Todos têm que intuir que no desporto, seja amador ou profissional, não pode haver lugar para estes energúmenos.

Louvo, apesar disso, a coragem do Benfica (meu clube) em não ceder á chantagem, legalizando a violência.
Entre a declaração de renúncia á violência e o efectivo abandono vai alguma distância.

Que não falte a coragem para apurar tudo o que seja possível!
Que a investigação seja o mais extensa e abrangente possível!
Que não faltem forças quando se chegar a pessoas importantes…
Que não se arranjem questões processuais para limpar a porcaria toda…
Que ninguém venha, depois de ter cometido crimes, ganhar dinheiro por “prisões ilegais”!
Que haja profissionalismo na investigação.

Lago
























Foto de Luiz Aguiar, aqui






Quando tua libélula forma
esvoaça sobre meu corpo
um lago vítreo rebenta
em círculos argênteos.
As margens se fazem distantes
e flutuo vitória-régia
na superfície do desejo maduro.
A vida, surpresa aquática,
me arrasta em cheiros
nas ondas negras dos teus cabelos.
Enfim, sem as amarras da razão,
aprendo a nadar
nas profundezas do teu riso
como uma estrela-do-mar.



Jurema Barreto de Souza

Carrossel



















P/ Lídia de Paula



tantas
noites
entre
nós

muitas luas
movendo silêncios
e palavras nuas

em cada gesto
sempre um festa
com gosto de paixão

te quero
te espero
muito além
de toda ilusão



Zhô Bertholini

E se Obama fosse africano?






















Os africanos rejubilaram com a vitória de Obama. Eu fui um deles. Depois de uma noite em claro, na irrealidade da penumbra da madrugada, as lágrimas corriam-me quando ele pronunciou o discurso de vencedor. Nesse momento, eu era também um vencedor. A mesma felicidade me atravessara quando Nelson Mandela foi libertado e o novo estadista sul-africano consolidava um caminho de dignificação de África.

Na noite de 5 de Novembro, o novo presidente norte-americano não era apenas um homem que falava. Era a sufocada voz da esperança que se reerguia, liberta, dentro de nós. Meu coração tinha votado, mesmo sem permissão: habituado a pedir pouco, eu festejava uma vitória sem dimensões. Ao sair à rua, a minha cidade se havia deslocado para Chicago, negros e brancos respirando comungando de uma mesma surpresa feliz. Porque a vitória de Obama não foi a de uma raça sobre outra: sem a participação massiva dos americanos de todas as raças (incluindo a da maioria branca) os Estados Unidos da América não nos entregariam motivo para festejarmos.

Nos dias seguintes, fui colhendo as reacções eufóricas dos mais diversos recantos do nosso continente. Pessoas anónimas, cidadãos comuns querem testemunhar a sua felicidade. Ao mesmo tempo fui tomando nota, com algumas reservas, das mensagens solidárias de dirigentes africanos. Quase todos chamavam Obama de "nosso irmão". E pensei: estarão todos esses dirigentes sendo sinceros? Será Barack Obama familiar de tanta gente politicamente tão diversa? Tenho dúvidas. Na pressa de ver preconceitos somente nos outros, não somos capazes de ver os nossos próprios racismos e xenofobias. Na pressa de condenar o Ocidente, esquecemo-nos de aceitar as lições que nos chegam desse outro lado do mundo.

Foi então que me chegou às mãos um texto de um escritor camaronês, Patrice Nganang, intitulado: "E se Obama fosse camaronês?". As questões que o meu colega dos Camarões levantava sugeriram-me perguntas diversas, formuladas agora em redor da seguinte hipótese: e se Obama fosse africano e concorresse à presidência num país africano? São estas perguntas que gostaria de explorar neste texto.

E se Obama fosse africano e candidato a uma presidência africana?

1. Se Obama fosse africano, um seu concorrente (um qualquer George Bush das Áfricas) inventaria mudanças na Constituição para prolongar o seu mandato para além do previsto. E o nosso Obama teria que esperar mais uns anos para voltar a candidatar-se. A espera poderia ser longa, se tomarmos em conta a permanência de um mesmo presidente no poder em África. Uns 41 anos no Gabão, 39 na Líbia, 28 no Zimbabwe, 28 na Guiné Equatorial, 28 em Angola, 27 no Egipto, 26 nos Camarões. E por aí fora, perfazendo uma quinzena de presidentes que governam há mais de 20 anos consecutivos no continente. Mugabe terá 90 anos quando terminar o mandato para o qual se impôs acima do veredicto popular.

2. Se Obama fosse africano, o mais provável era que, sendo um candidato do partido da oposição, não teria espaço para fazer campanha. Far-Ihe-iam como, por exemplo, no Zimbabwe ou nos Camarões: seria agredido fisicamente, seria preso consecutivamente, ser-Ihe-ia retirado o passaporte. Os Bushs de África não toleram opositores, não toleram a democracia.

3. Se Obama fosse africano, não seria sequer elegível em grande parte dos países porque as elites no poder inventaram leis restritivas que fecham as portas da presidência a filhos de estrangeiros e a descendentes de imigrantes. O nacionalista zambiano Kenneth Kaunda está sendo questionado, no seu próprio país, como filho de malawianos. Convenientemente "descobriram" que o homem que conduziu a Zâmbia à independência e governou por mais de 25 anos era, afinal, filho de malawianos e durante todo esse tempo tinha governado 'ilegalmente". Preso por alegadas intenções golpistas, o nosso Kenneth Kaunda (que dá nome a uma das mais nobres avenidas de Maputo) será interdito de fazer política e assim, o regime vigente, se verá livre de um opositor.

4. Sejamos claros: Obama é negro nos Estados Unidos. Em África ele é mulato. Se Obama fosse africano, veria a sua raça atirada contra o seu próprio rosto. Não que a cor da pele fosse importante para os povos que esperam ver nos seus líderes competência e trabalho sério. Mas as elites predadoras fariam campanha contra alguém que designariam por um "não autêntico africano". O mesmo irmão negro que hoje é saudado como novo Presidente americano seria vilipendiado em casa como sendo representante dos "outros", dos de outra raça, de outra bandeira (ou de nenhuma bandeira?).

5. Se fosse africano, o nosso "irmão" teria que dar muita explicação aos moralistas de serviço quando pensasse em incluir no discurso de agradecimento o apoio que recebeu dos homossexuais. Pecado mortal para os advogados da chamada "pureza africana". Para estes moralistas – tantas vezes no poder, tantas vezes com poder - a homossexualidade é um inaceitável vício mortal que é exterior a África e aos africanos.

6. Se ganhasse as eleições, Obama teria provavelmente que sentar-se à mesa de negociações e partilhar o poder com o derrotado, num processo negocial degradante que mostra que, em certos países africanos, o perdedor pode negociar aquilo que parece sagrado - a vontade do povo expressa nos votos. Nesta altura, estaria Barack Obama sentado numa mesa com um qualquer Bush em infinitas rondas negociais com mediadores africanos que nos ensinam que nos devemos contentar com as migalhas dos processos eleitorais que não correm a favor dos ditadores.

Inconclusivas conclusões

Fique claro: existem excepções neste quadro generalista. Sabemos todos de que excepções estamos falando e nós mesmos moçambicanos, fomos capazes de construir uma dessas condições à parte.

Fique igualmente claro: todos estes entraves a um Obama africano não seriam impostos pelo povo, mas pelos donos do poder, por elites que fazem da governação fonte de enriquecimento sem escrúpulos.

A verdade é que Obama não é africano. A verdade é que os africanos - as pessoas simples e os trabalhadores anónimos - festejaram com toda a alma a vitória americana de Obama. Mas não creio que os ditadores e corruptos de África tenham o direito de se fazerem convidados para esta festa.

Porque a alegria que milhões de africanos experimentaram no dia 5 de Novembro nascia de eles investirem em Obama exactamente o oposto daquilo que conheciam da sua experiência com os seus próprios dirigentes. Por muito que nos custe admitir, apenas uma minoria de estados africanos conhecem ou conheceram dirigentes preocupados com o bem público.

No mesmo dia em que Obama confirmava a condição de vencedor, os noticiários internacionais abarrotavam de notícias terríveis sobre África. No mesmo dia da vitória da maioria norte-americana, África continuava sendo derrotada por guerras, má gestão, ambição desmesurada de políticos gananciosos. Depois de terem morto a democracia, esses políticos estão matando a própria política. Resta a guerra, em alguns casos. Outros, a desistência e o cinismo.

Só há um modo verdadeiro de celebrar Obama nos países africanos: é lutar para que mais bandeiras de esperança possam nascer aqui, no nosso continente. É lutar para que Obamas africanos possam também vencer. E nós, africanos de todas as etnias e raças, vencermos com esses Obamas e celebrarmos em nossa casa aquilo que agora festejamos em casa alheia.



Por Mia Couto


Gentilmente enviado por email pelo amigo Aires Bustoff. Obrigado.

De que raio estamos á espera???
























Não é habitual debruçar-me por estas bandas com assuntos de actualidade… mas torna-se irresistível.
A poluição é tanta.
A desinformação é de tal ordem.
A insensatez está a um nível inultrapassável.

Por acaso alguém será capaz de parar para pensar no futuro das gerações mais jovens e, inevitavelmente, no destino a dar ao país???
Parece-me que não!

O governo, ciente da sua “certeza”, não abdica de nada.
A oposição, porque só existe na condição de ser obstáculo e de criar dificuldades e embaraços – qualquer que ela seja ou tenha sido! - eleva cada vez mais os sound-bytes indispensáveis á criação de um clima emocional do qual possa tirar proveito.

Mas que alternativas a esta miserável situação??
Há que prosseguir cegamente???
Há que parar para pensar???

Que o clima eleitoral que se vive justifica a berraria toda – já o sabemos!
Que nestas circunstâncias a emoção prevalece sobre a razão – é evidente!
Que todo este impasse na Educação (e noutros sectores, também…) – que se vive desde há 34 anos! – é dramático para o país – até um imbecil o sabe.

Lamentável é que não se tenha parado para pensar… O tempo do PREC passou há muito e alguma tranquilidade foi devolvida entretanto.

Vou colocar tudo em causa!

O sistema educativo está obsoleto porque não corresponde ás necessidades do país e hipoteca o seu futuro.
É sabido que qualquer moldavo, escandinavo, esloveno que, honestamente, dê no nosso país o seu suor para a riqueza e o desenvolvimento do nosso país, e tenha conseguido trazer a sua família, fica perplexo com a desorganização, insegurança, falta de exigência e de trabalho nas escolas portuguesas.
Ninguém é capaz de negar isto!
Nem o Dr. Mário Nogueira…nem a Ministra da Educação, ou será que são???

Se o 25 de Abril era necessário para democratizar o acesso á educação e ao funcionamento das escolas a verdade é que obliterou por completo a exigência, negou a competitividade e caucionou o desenvolvimento da mediocridade.
Nem 34 anos chegaram ainda para se ver o inevitável.
E também não há o menor esboço de coragem política para pôr cobro a este estado de coisas.

Se antes prevalecia o elitismo, agora passamos a conviver com multidões de licenciados sem emprego, alunos que abandonam a escola e níveis assustadores de iliteracia.

Ao poder discricionário, e muitas vezes violento, dos professores sucedeu a anarquia governada pelas RGA’s e a esta sucedeu uma mixórdia que pretende estabelecer o equilíbrio (?!?!?) entre professores, pais e alunos.
Ao terror exercido pelos professores sucedeu o enxovalho e as ameaças a estes.

A situação é tão grave que os pais foram transformados numa espécie de “Comissão de Melhoramentos” da escola que tem, inclusive, como fim angariar na sociedade que a envolve meios de subsistência á própria escola.
É evidente que “não há almoços á borla”… e os pais que integram as Comissões de Pais, além do que já foi dito, mais não fazem que garantir a segurança e a transição de ano dos seus rebentos.
Ainda não conheci uma criança dessas que não tenha transitado…
O que vem mostrar a desorganização do sistema e a confusão existente.

Salvo melhor opinião, os professores devem dedicar-se a actividades lectivas e de gestão da própria escola; os alunos devem estudar e serem-lhes concedidas todas as oportunidades e condições de aprendizagem; os pais devem assegurar a educação (princípios de vida, de sã convivência, de aprendizagem da diferença e de democracia, de respeito dos seus direitos e dos direitos alheios) dos seus filhos; finalmente, ao Ministério cabe a obrigação inalienável de arquitectar um sistema educativo funcional, lógico, que valorize todos os intervenientes, que os integre e os forme para a sociedade, que assegure a todos os que tem capacidade e vontade de seguir os estudos as melhores condições de excelência, não descurando a obrigatoriedade de formar em estabelecimentos, apetrechados para o efeito, de todos aqueles que pretendam enveredar por vias profissionais e técnicas.

Não é isto, de todo, que assistimos… infelizmente!

Foi decretado que todos, sem excepção, têm que ser doutores, embora o canudo de pouco lhes sirva ou, no mínimo têm que andar a penar inutilmente pelos corredores escolares sem proveito nem glória…saindo da escola com um certificado que de nada serve.

Se antigamente um burro carregado de livros era um doutor… hoje nem o carregamento de livros, em alguns casos, estabelece qualquer diferença entre uns e outros.
A situação é tão lamentável que quem queira singrar, estando habilitado com grau académico, tem que obter pós-graduação em qualquer universidade britânica, francesa ou americana. Ou seja, a excelência, a disciplina e a exigência que deveriam ser componentes obrigatórias do sistema são adquiridas… no estrangeiro.

Acresce, como sempre, que como não nos é dado valor no nosso país ou, quem tem ideias e vontade de progredir e investigar é, regra geral, tido por lunático e estúpido ambicioso, acabamos por exportar as nossas melhores capacidades do mesmo modo que exportámos (e continuamos a fazê-lo…) mão de obra que honra não só a produtividade, a capacidade inventiva e a adaptabilidade do trabalhador português que só não é reconhecido por essa súcia de sumidades a que alguns chamam, pomposamente, empresários portugueses.
Daí que a “ideia” (infeliz e preconceituosa) de Manuela Ferreira Leite relativamente á ajuda no combate ao desemprego em Cabo Verde e na Ucrânia que o nosso país proporciona, seja uma aberração proveniente de alguém com vestígios de alguma doença degenerativa…
Angola, África do Sul, Espanha, Reino Unido… e outros são grandes auxiliares da luta contra o desemprego em… Portugal!

O dramático é que não disse… que exportamos a nossa classe média, bons cérebros, iniciativa e importamos mão de obra barata e ilegal, na maior parte dos casos.
Na verdade ninguém esperava esse rasgo…

Voltando atrás… á educação e ao sistema de ensino deve ser repensado tudo.


-Pré-primário
-Primário
-Secundário (Liceal ou Técnico)
-Superior

-Gestão da escolas pelos professores
-Responsabilização do ministério por todos os aspectos de apoio regulamentar, logístico, lectivo e organizativo
-Acompanhamento das actividades por parte dos pais
-Garantir o cumprimento obrigatório de todos os programas

-Cultura de exigência
-Prémios á excelência
-Exames nacionais exigentes em cada fim de ciclo
-Retoma dos incentivos ao estudo que eram as “Dispensas de Exame” a partir de determinado nível de aproveitamento de excelência

-Criação de Escolas Técnicas para as várias opções vocacionais, devidamente apetrechadas tecnológica e humanamente
-Voltar a criar condições á dignificação da actividade lectiva
-Assegurar segurança e dignidade ao espaço escolar
-Não recear as medidas adequadas disciplinares ou outras que tenham que ser tomadas
-Adequar a escola ao ambiente envolvente e á composição étnica e cultural
-Promover a integração e o desenvolvimento

-Admitir que a única forma justa (e eficiente) de avaliar os professores é através dos resultados obtidos pelos alunos, em absoluta equidade, com provas nacionais e anuais.
-Promover incentivos á assiduidade dos professores criando forma integrada de avaliação, conjuntamente com os resultados lectivos


Quem discorda???
Quem tem medo???


Nós conseguimos fazer um país melhor??? Claro que conseguimos…
Como??? Só a educação e a formação o permitem.

De que raio estamos á espera???

no baloiço da manhã


























xxxxxxxxxxxxxxxxxxà ducha



(se a cor
da ilha de luanda
namora a traça
da tua saia)
o beija-flor
alimenta-se da tua flora
e a infinita violeta
lambe a espada
a nuvem da prata
ilude a traça
na manhã do teu baloiço




Fernando Kafukeno

Rebita























Foto de "Angola em fotos"




Mulata da minha alma
batuque dos meus sentidos,
meus nervos encandecidos
vibram por ti, sem ter calma.

Por isso vou á rebita,
quase triste e indeciso,
a queimar minha desdita
nas chamas do teu sorriso.

E, triste, assim, vou dançar,
vou dançar e vou beber
o vinho do teu olhar,
que me faz entontecer.

Ouvindo, longe, tocar
o quissange do gentio,
que vive, além no palmar,
onde corre o verde rio!

E depois adormecer
na tua esteira de prata,
onde quero, enfim, morrer,
oh minha linda mulata.

..........................................

Mulata da minha alma,
batuque dos meus sentidos...

Por isso vou á rebita,
quase triste e indeciso,
a queimar minha desdita
nas chamas do teu sorriso.



Tomaz Vieira da Cruz

Em 12 dias...

A esperança


























A sorte de a estupidez (...) não ser mortal








A perda




















O grito de revolta...

















O silêncio (que já vimos noutras ocasiões)




















A "falta de comparência"























Quando todos estão contra... não significa que estejamos no caminho certo!

Angola























Os bardos estão dormentes
- mau sintoma -
os bardos estão desiludidos
pela certa.

Os bardos não estão gritando
ao mundo
o sofrimento do povo
nem denunciando.

Nem exigindo
paz
nem dizendo à juventude
que é preciso erguer-se.

Os bardos estão calados
- mau sintoma -
os bardos estão desiludidos
pela certa.

Mas terão de ser eles
a soltarem em catadupas
o amor patriótico
a fé, nos valores defendidos
dos que lutaram
para que houvesse o 11 de Novembro
afirmando
que das cinzas ressurgirá
a voz indómita do povo.

Desta agonia
deste pesadelo
Angola saíra triunfante
por sobre as valas comuns.

No decurso da humanidade
a luta entre o bem e o mal
foi uma constante
o bem foi sempre abrindo caminhos de amor.



Eugénia Neto