Era no tempo dos tamarindos


















Era no tempo dos tamarindos
Meu pai sempre me acordava pela manhã
E ia cantando para o quintal
Enquanto fazia a barba
Debaixo do caramanchão
Da buganvília cor-de-violeta.

Era no tempo dos tamarindos
Zenza Niala vinha entrando na cancela
À cabeça a quinda carregadinha de fruta
Sempre cumprimentava minha mãe:
-“Sápêrê, Dona!”
Minha mãe respondia:
-“Olá”
Ela agachava no chão
Destapava a quinda
E por sob as folhas frescas de mamoeiro
Mostrava papaias e pitangas saborosas

Às vezes trazia fruta-pinha e sápe-sápe

Era sempre o mesmo diálogo
Minha mãe:”Chingamin?”
Zenza Niala no chão sorria
Mostrava os dentes de marfim
E respondia
-“Meia-cinco, sinhóra”

Era no tempo dos tamarindos.

E havia “bigodes” e “bicos-de-lacre”
Cantando nas acácias do quintal.

Depois Zenza Niala ia embora,
As ancas baloiçando
A quinda na cabeça

Era no tempo dos tamarindos



Ernesto Lara Filho








Fausto
3 Responses
  1. Lembro que há uma canção de Fausto com este poema de Ernesto Lara Filho.


  2. Cacusso Says:

    Bem Lembrado, amigo Denudado!
    do album "A preto e branco" de 1989, que não possuo...Estou a tentar ver se encontro essa faixa para publicação. Fá-lo-ei de imediato.

    Um grande abraço!


  3. Unknown Says:

    Grandes mundos. Recordar é viver.