Mãe
domingo, maio 04, 2008
Minha mãe:
trago a resina das velhas árvores
da floresta nas minha veias.
E a sina de nascença
No meio das baladas à volta da fogueira
tu sabes como é sempre uma dor nova
sabes ou não sabes, minha Mãe?
Sabes ou não sabes
o mistério de olhos inflamados de macho
que um dia encontraste no teu caminho
de tombasana* de pés descalços?
Sabes ou não sabes, Mãe
a resina das velhas árvores plantadas pelos espíritos
as blasfémias dos mortos salgando as raízes virgens
e as grandes luas de ansiedade esticando
... as peles dos tambores enraivecidos
e dando às folhas das palmeiras
o brilho incandescente das catanas nuas?
E no sabor do encantamento, Mãe
dos nossos desenfeitiçados feitiços ancestrais
o exorcismo ingénuo das tuas missangas
o maravilhoso mecheu das tuas canções
e o segredo do teu corpo possuído
mas de materno sangue inviolável
donde a minha sina nasceu.
No
espaço da tua sepultura de negra
sabes ou não sabes a verdade
agora sabes ou não sabes
minha Mãe?
*Tombasana - moça, rapariga solteira.
José Craveirinha
In "Karingana ua karingana"